Sunday, February 26, 2012

Toponímia da Serra do Gerês: Pedra Bela


Não é que tenha intenção de procurar estudar a etimologia dos topónimos da serra do Gerês, mas uma entrada do blogue Carris recordou-me que já tinha lido algures sobre o topónimo Pedra Bela. Seguindo as indicações recolhidas voltei à estante em busca dessa explicação e no Gerez (Notas Etnográficas, Arqueológicas e Históricas) de Tude de Sousa reencontrei o que pode ser uma interessante explicação. Segundo uma opinião do Padre Martins Capela, que Tude de Sousa publica, Pedra Bela seria uma corrupção de Pedra de Vela, um local onde os pastores velavam o gado.


"A tal Pedra Bela, muito conhecida nas Caldas suponho não ter jus a tal epíteto: há-de ser Pedra de Vela, donde os pastores velavam a caça ou as mandas pelo vale." Padre Martins Capela, revista Estudos sociais, nº 3, de Junho de 1910 

Thursday, February 23, 2012

Sobre a possível origem do topónimo Matança na Serra do Gerês

Já tratei aqui sobre uma possível origem do topónimo Matança na Serra do Gerês quando partilhei uma leitura das memórias paroquiais da freguesia de Outeiro (Montalegre). A hipótese então avançada pode ser consultada aqui e apontava para um dos muitos reencontros na altura da Restauração. Época em que Pitões da Júnia terá sido incendiada, as pontes da Geira derrubadas e durante vários anos terão existido diversos conflitos fronteiriços.

Tal como esclareci então, considero que são estas pequenas coisas que ajudam a enriquecer os que gostam de andar pela serra por razões diferentes da, usando uma expressão de Unamuno aprendida no Torga, mera voluptuosidade da fadiga. Gosto de partilhar com os companheiros de caminhada o que vou descobrindo sobre a serra e os seus segredos.

Na leitura da monografia de Pincães (ver aqui) encontrei uma outra hipótese que aponta para uma justificação diferente e muito mais anterior do topónimo Matança. Com efeito, o livro Aldeia de Pincães transcreve parcialmente um manuscrito de 1744, do Padre Diogo Martins Pereira, no qual se pode ler:

"...
34º Estes três acima repartidos no grande distrito e âmbito desta freguesia fariam guerra aos sarracenos e mouros que infesteram quase toda a Espanha, e nesta freguesia lhe era fácil a defesa junto com os mais cristão que povoaram aquelas montanhas da serra do Gerês, como em toda esta serra ainda hoje se veêm, foi antigamente cultivada tudo aquilo que podia dar fruto para sustentar os perseguidos e ainda esta casa da Freira tem naquela serra várias propriedades em que se colhia e colhe bom centeio como é o Pêro, curral das mangas, dois em Lagoa, um no Pássaro e outro em Rocalva e muitos desertos que ninguém cultiva, e naquele tempo se cultivaram para remédio dos viventes.
35º E que foi certa batalha que os cristãos ali deram aos mouros, como sediz desta batalha, tomaram o nome de Matança pelos muitos que, os cristãos ali mataram se haviam de achar, a ela, os três referidos com toda a mais cristandade que havia por aquela serra ou os seus descendentes que não havia degeneras daquela aperto dos seus antepassados, e assim serviu esta freguesia  naquele tempo de Valha Couto e baluarte da cristandade  como seria na referida batalha da Matança a qual fica vindo da parte de  Pitões para o meio do Gerês adiante, dos Currais de Lamalonga, limites desta freguesia de Cabril.
36º E seria na ocasião que o príncipe Dom Pelágio, se viu favor vindo do Céu nas Covas de Oviedo, quando as setas que contra ele aos seus atiravam os mouros, as mesmas que atiraram e se feriam e matavam e aos muito mouros que ali escapavam se viriam com esta serra em paradeiro fazendo nela redutos e cateteres no áspero da mesma serra, donde os cristãos os expulsaram e fizeram  retroceder até Matança, onde lhe deram batalha, e que por isso lhe deram o nome de Matança pelos muitos que ali mataram, donde não puderam entrar nesta freguesia, a qual tinham extremado ódio, sendo esse ódio comum contra toda a cristandade que vivia nas Espanhas, venha a ser especial contra os povos que viviam nesta freguesia tão extensa, e lhe fazia tanto dano como se viu nesta batalha da Matança e dizem que juraram os mouros vencer ou morrer como morreram os mais deles, e também dizem que deste solene juramento que fizeram no Gerês, tomara a serra este nome de Gerês, e então se não deve escrever Gerês, mas sim Jurês.
..."

Parece-me óbvio que estamos a falar do mesmo local e, sendo assim, pelo menos uma das explicações para o topónimo estará errada. Ainda que não queira tomar partido por nenhuma das possíveis explicações, devo esclarecer que me parece mais credível a que encontrei nas Memórias Paroquiais. Fundamento a minha opinião em duas grandes razões.

A primeira porque são conhecidos os muitos conflitos fronteiriços que ocorreram na Restauração, a que o manuscrito também faz referência, e me custa acreditar num reencontro entre cristão e mouros num local tão elevado e afastado dos locais naturais para atravessamento da serra. Mais ainda quando relaciona esse reencontro com Pelágio e a Batalha de Covadonga (o que situa esse reencontro por volta de 721).

A segunda porque me questionei sobre a etimologia da vocábulo Matança e descobri uma provável, apesar de não confirmada e controversa, origem árabe (ver aqui). Ora, confirmando-se a origem , seria muito estranho que os critãos nomeassem o local da batalha com um vocábulo de origem árabe (1).

Ainda assim, não quero afirmar definitivamente qualquer uma das explicações para o topónimo. Que cada um seja livre para escolher uma das duas. Ou faça como eu, relate ambas e deixe para terceiros a decisão sobre elas.

(1) há quem defenda que a origem da palavra é “matar”, do Latim MACTARE, “imolar, sacrificar aos deuses”. Aparentemente o verbo significava, no início, o ato de elevar o objeto de sacrifício ao ar, em direção ao céu. Depois se estendeu ao ato de tirar a vida da oferenda (ver aqui).


Monday, February 13, 2012

Ainda sobre o Curral do Absedo

Referência ao curral do Abessedo (Absedo) no documento

Aproveitando uma ida a Pincães (Cabril, Montalegre) enriqueci a minha biblioteca com mais um livro sobre a Serra do Gerês. O livro Aldeia de Pincães é uma monografia da aldeia, da autoria de António Fernando Machado Ribeiro Guimarães  e publicada com o apoio da Associação Dinamizadora dos Interesses dos Compartes de Pincães - ADICP. No prefácio é dito que o livro está escrito com o coração e de facto o autor  assumiu a sua ligação afectiva com a aldeia sem medo de perder  objectividade. Para já fiquei-me por uma leitura rápida e pouco aprofundada ao livro. Apenas a suficiente para referenciar alguma da informação tratada e tenciono voltar a ele com mais tempo pois encontrei diversas pistas que tenciono explorar no futuro.

No livro encontrei também um documento, a que chamarei "O regime de pastagens das vezeiras da Serra do Gerês segundo os usos e costumes antigos"  que partilho parcialmente aqui. Já tinha lido referências a este documento no blogue Cabra do Gerês e essa foi uma das razões pelas quais procurei este livro. O documento pode esclarecer que vezeira que utilizava o Curral do Absedo (Abessedo ou Abecêdo) e com isso resolver a questão do nome. O documento poderá ainda ajudar a perceber os usos e costumes das vezeiras do Gerês Oriental nele citadas e esta é umas das pistas futuras que tenciono explorar.

O Curral do Absedo, na grafia de Tude de Sousa, que já tratei neste blogue aqui,  desperta a curiosidade de muitos dos apaixonados pela serra por diversos motivos. Para não repetir o Rui Barbosa, aconselho a leitura do que blogue Carris escreveu obre este curral. Situado numa das zonas mais inacessíveis da serra, encaixado numa pequena chã a uma cota de aproximadamente 1290 metros, qualquer que seja o trilho escolhido para visitar este curral obriga primeiro a subir  aos 1400 metros. Um esforço que não deve ser menosprezado pelos que conhecem menos bem a zona, exigente para os dias curtos de Inverno ou de temperaturas elevadas, sem água, nos dias de Verão.

De acordo com este documento, o curral do Absedo seria utilizado pela vezeira dos bois de Pincães (Pincães, S. Ane, S. Lourenço, Chelo, Fontainho, Vila Boa e Cavalos) . Informação que esclarece a expressão de "monte dos bois" que ouvi  em Agosto último a uns pastores nas Lagoas do Marinho. Iam esses pastores em busca de umas vacas que por lá andavam e que deveriam ser as que eu encontrei mais tarde, já no final do Verão, na última vez que passei pelo Absedo.

Naturalmente que esta informação não esclarece definitivamente o seu nome e a utilização deste curral por esta vezeira pode ser posterior ao abandono do curral pelas gentes de Vilarinho. Há ainda a hipótese de se tratar de um curral utilizado por mais do que uma vezeira e ter diferente designação para as gentes de Vilarinho e para as gentes de Pincães.  Seja como for todas as fontes documentais parecem indicar que o curral se chama Absedo, Abessedo ou Abecêdo.
pormenor do documento "O regime de pastagens das vezeiras
da Serra do Gerês segundo os usos e costumes antigo"