Friday, August 31, 2007

Gerês organiza circuito turístico de mini-autocarro

Os visitantes do Gerês e do concelho de Terras de Bouro podem contar com a oferta de um circuito turístico através de mini-autocarro que percorre diariamente os locais mais emblemáticos da serra do Gerês.

A implementação do circuito resulta da parceria entre a Câmara Municipal, o Parque Nacional da Peneda-Gerês e a Empresa Hoteleira do Gerês, possibilitando a visita a vários locais sem a necessidade de utilizar transporte particular e contactando directamente com a natureza uma vez que está concebido de forma que as pessoas possam entrar e sair em qualquer ponto do percurso, realizar visitas a vários locais à sua escolha, inclusive almoçar no Campo do Gerês ou vila do Gerês, visitar lagoas, passear na via romana, conhecer a fronteira da Portela do Homem, retomando o autocarro no horário que desejarem.

O circuito começa e termina na vila do Gerês, passando pelos vários locais, em horários pré-determinados, sendo também permitido que o turista possa realizar apenas parte do circuito, realizando o restante a pé, o que lhe confere alguma novidade e o torna aliciante.

Embora o circuito não possa dar resposta a quantos procuram o Gerês até 15 de Setembro, todavia, é mais uma oferta para quem gosta de deixar o automóvel e contactar directamente com a natureza e entrar em plena serra e apreciar as cascatas, lagoas, flora, etc.

As informações sobre o circuito encontram-se nos postos de turismo e nas diversas unidades hoteleiras, sendo realizado pelos autocarros da Empresa Hoteleira do Gerês, entre 2,ª e 6.ª feira, a preço simbólico, e, aos fins-de-semana, entre a vila do Gerês e a fronteira da Portela do Homem, pelo autocarro do Parque Nacional de forma gratuita.

site: CM Terras de Bouro

A primeira vez que me falaram neste circuito estranhei. O Parque parecia estar a contradizer as suas próprias orientações. O que até não seria tão absurdo, porque os técnicos do PNPG reconhecem em voz baixa que o plano de ordenamento é demasiado restritivo. E, como a revisão do plano curso está em curso, poderia ser mais um exemplo do limbo em que se encontra. Esta notícia no site da CM Terras de Bouro esclareceu-me melhor.

Ainda que não me pareça recomendável que este circuito passe pelo troço Bouça da Mó - Mata da Albergaria (Geira Romana), ainda que este circuito possa ter dado origem a alguns abusos, reconheço que é uma boa medida. E que poderá ter possibilitado que alguns turistas tenha conhecido um pouco melhor a serra.

O problema é que os mesmo princípios de que validam a existência deste circuito deviam validar a possibilidade de ao longo do ano ser possível "entrar em plena serra e apreciar as cascatas, lagoas, flora, etc". Aliás, os que fora do período estival procuram a serra até a procuram com motivações não exclusivamente turísticas. Mas é a estes, que destingem a serra de uma qualquer praia fluvial, que não fazem lixo, que apreciam a serra, que até animam economicamente a zona fora dos períodos de Verão, a quem, aparentemente, mais se pretende restringir.

Eu concordo que o PNPG possa estabelecer regras, que possa controlar o acesso à serra. Não posso concordar que o ICN não possa distinguir uma actividade sem fins lucrativos de uma actividade empresarial. Temo que ultrapassadas as limitações de um plano de ordenamento caduco as actividades de montanha fiquem proibidas a muitos dos grupos informais que as praticam. Apenas porque não podem cumprir com requisitos próprios de actividades empresariais. Não defendo a não existência de regras. Não defendo regras que só alguns possam cumprir.

nota: a motivação para esta refexão foi o conhecimento de casos concretos

Thursday, August 30, 2007

Lobos e outras histórias


Avistar um lobo era algo que desejava há muito. Sabia que as probabilidades eram reduzidas. Os lobos são animais muito inteligentes e raramente se deixam avistar. Numa actividade da Ecotura, percorri o Planalto de Castro Laboreiro com Pedro Alarcão e a Anabela Moedas, autores do documentário sobre o Lobo da RTP. Nessa ocasião escutei algumas das histórias sobre o lobo e sobre a gravação do seu documentário. Fiquei a conhecer um pouco melhor o lobo, a sua organização social, os mitos e a sua relação com o homem. Aprendi também a respeitá-lo mais. No último ano oor diversas vezes encontrei vestígios de lobo nas caminhadas. E numa caminhada da AAEUM um colega avistou um lobo, mas estava muito distante para também o ver. Sábado passado a minha sorte mudou.

Numa caminhada de reconhecimento do planalto de Castro Laboreiro, com um pequeno grupo do UPB, vi o meu primeiro lobo. A nossa ideia era apenas reconhecer um terreno fácil para uma caminhada nocturna, mas aproveitámos também para subir ao Giestoso. No regresso, em terreno aberto, um colega dá o alerta. Um pouco à frente, um lobo juvenil tinha saltado e fugia velozmente. Acompanhei-o por entre o mato até desaparecer numa lomba do terreno. Nunca o vi por inteiro. Apenas o deslumbrei por entre a vegetação. Mas o dia já estava ganho.

No planalto também avistámos o voo de duas aves que nos pareceram águias. As fotos que tirei não permitem a sua identificação.

O pré-programa da caminhada nocturna metia uma feijoada oferecida por um casal do UPB , o Coura e a Tília. A festa prometia ser rija. No final da tarde a chuva parecia querer estragar a programa. O jantar, que seria na zona de lazer de Lamas de Mouro, foi transferido para um café de uns senhores simpáticos que nos abriram as portas. A meio do jantar já agradecia a chuva porque me parecia impossível caminhar depois da feijoada. Só que chuva parou e a vontade de colocar as botas no trilho foi superior. Escolhemos um trilho mais fácil e fomos caminhar pelos estradões do planalto. No único momento de hesitação valeu-nos encontrar um jipe que percorria o planalto. Algumas indicações e rapidamente nos orientámos. No final ainda ficámos um pouco à conversa até o cansaço nos aconselhar a regressar.

Chegar a Braga foi mais complicado. O cansaço era grande. Eu inicialmente tinha decidido pernoitar em Lamas de Mouro, mas a chuva fez-me mudar de planos. Cheguei a casa com a luz do dia.

Friday, August 24, 2007

Miguel Torga e o Minho

Miguel Torga não gostava do Minho. Esta afirmação possui algum fundamento, pois por diversas vezes ele o escreveu. São diversas as entradas no seu Diário que reflectem esta antipatia. Só que foi claramente uma relação de amor/ódio.

Miguel Torga era um homem da montanha. Um homem com raízes nas fragas e dava-se mal com o verde o Minho. De certa forma foi uma relação marcada pelo eterno conflito do homem da montanha com o homem da ribeira. Para ele as "cangas lavradas e coloridas que ofendiam as molhelhas do suor verdadeiro", as festas "encandeavam a lucidez dos sentidos" e não partilhava da religiosidade de um povo "a cantar o Avé atrás do cura da freguesia".

No documentário que a RTP exibiu António Barreto disse que tinha conhecimento que o Miguel Torga teria dito coisas boas sobre Coimbra, onde escolheu viver, e sobre a Universidade de Coimbra, onde se formou, mas que nunca as tinha escutado ou lido. Pelo contrário, são conhecidas algumas opiniões bastante azedas sobre ambas. Do Minho sabemos que por cá passou diversas temporadas e que o percorreu. Um dos maiores capítulos do seu livro Portugal é mesmo sobre o Minho. Maior somente o capítulo sobre o seu Reino Maravilhoso: Trás-os-Montes.

Como minhoto teria naturalmente preferido escritos mais simpáticos, mas há que reconhecer que pelo menos em parte teria razão.

Como convite à leitura fica um pequeno excerto do Portugal de Miguel Torga:

"Desanimado, meti para Castro Laboreiro à procura dum Minho com menos milho, menos couves, menos erva, menos videiras de enforcado e mais meu. Um Minho que o não fosse, afinal. Encontrei-o logo dois passos adiante, severo, de curcelo e carapuça.

A relva dera finalmente lugar à terra nua que, parda como o burel, tinha ossos e chagas. O colmo de centeio, curtido pelos nevões, perdera o riso alvar das malhadas. Identificara-se com o panorama humano, e cobria pudicamente a dor do frio e da fome. Um rebanho de ovelhas silenciosas retouçava as pedras da fortaleza desmantelada. E uma velha muito velha, desmemoriada como uma coruja das catacumbas, vigiava a porta do baluarte, a fiar o tempo. Era a pré-história ao natural, à espera da neta.

Ó castrejinha do monte,
Que deitas no teu cabelo?
Deito-lhe água da fonte
E rama de tormentelo.

Bonita, esbofeteada do frio, a cachopa vinha à frente dum carro de bois carregado de canhotas. Preparava a casa de inverno para quandochegasse a hora da transumância e toda a família —pais, irmãos, gados, pulgas e percevejos— descesse dos cortelhos da montanha para os cortelhos do vale, abrigados das neves.

– Conhece esta cantiga?
– Ãhn?

Falava uma língua estranha, alheia ao Diário de Noticias, mas próxima do Livro de Linhagens do Conde de Barcelos.

– É legitimo este cão?
– É cadela.

Negro, mal encarado, o bicho, olhou-me por baixo, a ver se eu insistia na ofensa. O matriarcado teimava ainda...

– A Peneda?

A moça apontou a vara. E, como ao gesto de um prestidigitador, foram- se desvendando a meus olhos mistérios sucessivos. Todo o grande maciço de pedra se abriu como uma rosa. A Peneda, o Suajo e o Lindoso.Um nunca mais acabar de espinhaços e de abismos, de encostas e planaltos. Um mundo de primária beleza, de inviolada intimidade, que ora fugia esquivo pelas brenhas, tímido e secreto, ora sorria dum postigo, acolhedor e fraterno.

Quando dei conta, estava no topo da Serra Amarela a merendar com a solidão. Tinham desaparecido de vez as cangas lavradas e coloridas que ofendiam as molhelhas do suor verdadeiro. A zanguizarra dos pandeiros festivos e as lágrimas dos foguetes já não encandeavam a lucidez dos sentidos. Os aventais de chita garrida davam lugar aos de estopa encardida. Nem contratos pré-nupciais ardilosos, nem torres feudais, nem rebanhos de homens pequeninos, dóceis, a cantar o Avé atrás do cura da freguesia. Pisava, realmente, a alta e livre terra dos pastores, dos contrabandistas e das urzes. As pernas de granito dum velho fojo abriam-se num grande V, como as dum gigante no sono da sesta. E saltou-me vivo à lembrança o instantâneo de Joaquim Vicente Araújo, quando no seu Diário Filosófico da Viagem ao Gerês fala duma batida aos lobos, que presenciou, e em que toda a população masculina do lugar colaborara: «Era cousa de ver a má catadura duns e a presteza de todos, que descalços, outros de socos, armados desciam pelas fragas». Sem a coragem dos avós, agora os habitantes comunitârios de Vilarinho da Furna atacavam as alcateias a estricnina e caçavam corças furtivamente. Mas mesmo assim nao faziam má figura ao lado do rio Homem, que, talvez a querer justificar um nome que a etimologia lhe nega, parecia um lavrador numa leira de pedras, tenaz em todo o percurso, e sempre límpido, a espelhar o céu. Na margem de lá, o Pé do Cabril, solene, esperava a abraço duma ascensão. E coma a desafiar aquela pétrea majestade, arrogante e lustroso, o toira do lugar roncou de uma chã. Símbolo tangível da virilidade e da fecundação, nenhum outro deus, ali, tinha forças para o destronar. Plenitude encarnada do instinto natural de preservação da seiva capaz de se multiplicar em cada acto de amor, era ele o pólo de todos os cultos cuItos e desvelos. Rei já no tempo das casarotas megalíticas que me rodeavam, continuava a sê-lo ainda no presente por exigência e graça da própria vida.

Atravessada a ponte em corcova, galgados os muros ciclópicos da Calcedónia, numa erudiçao feita à custa dos pés, e guiado pelos miliários imperiais, segui a geira romana até chegar à Portela do Homem, onde as legiões invasoras pareciam aquarteladas. Mas foi a guarda fiscal, vigilante, que me recebeu.

A uma sombra tutelar, pouco depois, num minuto de descanso, a Historia recente da Pátria avivou-se.

– Uma das incursoes monarquicas foi por aqui...
– Tentaram... Tentaram...
– Este Minho! Este Minho!...
– Tem uma costela talassa, tem...

Mas recusei-me a reintegrar, por simples razões partidárias, aquelas viris penedias no planisfério verdurengo de onde a própria natureza as libertara. Tranquei as portas da memória e, pela margem do rio, subi aos Carris. Uma multidão minava as fragas à procura de volfrâmio, por conta da guerra e de quem a fazia. Teixos e carvalhos centenários acompanharam-me quase todo o caminho. Só desistiram quando me aproximei do cume da montanha, onde a vida, já sem raizes, tenta levantar voo.

Agora, sim! Agora podia, em perfeita paz de espírito, estender a minha ternura lusíada por toda a portuguesa Galiza percorrida. Pano de fundo, o mar de terras baixas era apenas um cenário esfumado; à boca do palco reflectiam-se nas várias albufeiras do Cávado a redonda pureza da Cabreira e a beleza sem par do Gerês. E o espectador emotivo já não tinha necessidade de brigar com o cavador instintivo que havia também dentro de mim. Embora através da magia agreste dos relevos, talvez por contraste, impunha-se-me com outra significação a abundância dos canastros, o optimismo dos semeadores e a própria embriaguez que anestesiava cada acto, no fundo necessária à saúde dos corpos individuais e colectivos. Integrava o alegrete perpétuo no meu caleidoscópio telúrico. Bem vistas as coisas, se ele não existisse faria falta no arranjo final do ramalhete corográfico português.

Em acção de graças por esta conclusão pacificadora, rezei orações pagãs no Altar de Cabrões, antes de subir à Nevosa e aos Cornos da Fonte Fria a experimentar como se tremem maleitas em pleno Agosto.

Estava exausto, mas o corpo recusava-se a parar. Pitões acenava-me lá longe, de tectos colmados e de chancas ferradas. Não obstante pisar o mais belo pedaço de chão pátrio, queria repousar em terra real e consubstancialmente minha. Ansiava por estender os ossos nos tomentos de Barroso, onde, apesar de tudo, era mais seguro adormecer. Quem me garantia a mim que, mesmo alcandorado nos carrapitos doirados da Borrajeira, não voltaria a ter pela noite fora um pesadelo verde?"

Dois objectivos

Recentemente percorri dois dos locais que mais desejava conhecer no PNPG: A travessia Pitões-Portela e a cumeada da Encostado Sol. Em ambas as ocasiões foram dias de forte calor mas a beleza dos locais compensou. São zonas duras, de uma beleza muito longe das paisagens bucólicas como muitos imaginam o Gerês. A maioria das pessoas que visitam o Gerês conhece-o junto às estradas, não imagina como é longe delas. A serra é dura, despida, por vezes seca mas pura. Eu gosto de ambas. Gosto do fresco das matas e a autenticidade das fragas. Prefiro perder-me nas segundas mas sentiria a falta das primeiras.

A travessia é uma experiência dura e um bom exercício de orientação. Os antigos percursos estão esquecidos. A zona é uma sucessão de corgos e quase não há mariolas para nos orientar o caminho. Particamente não há vegetação alta. Alguns currais esquecidos onde pastam livremente grupos de garranos. A área do PNPG pertencente a Montalegre é também umas das zonas onde me sinto mais livre.

Subir à cumeada da Encosta do Sol não é fácil, mas a perspectiva sobre o vale do Homem compensa largamente o esforço. Conhecia diversos relatos. Finalmente cumpri também este objectivo.

O sinal negativo em ambas foi ter que descer o estradão de acesso aos Carris. Nada me é tão penoso como caminhar naquele leito de pedras roladas. Pior só a confusão estival nas lagoas da Portela do Homem.

Não percebo porque o PNPG que é tão restrivo com certas coisas permite esta situação. É verdade que não consigo imaginar uma razão para impedir que as pessoas se banhem nas lagoas. Recordo-me é de muitas que justificariam que um guarda do Parque impedisse o depositar de lixo junto ao caminho.


Sunday, August 12, 2007

Legado











O que eu espero , não vem.
Mas ficas tu, leitor, encarregado
De receber o sonho.
Abre-lhe os braços, como se chegase
O teu pai do Brasil,
A tua mãe, do céu,
O teu melhor amigo, da cadeia.
Abre-lhe os braços como se quisesses
Abraçar toda a luz que te rodeia.
Não perguntes por que tardou tanto
E não chegou a tempo de me ver
Uns têm a sina de sonhar a vida,
Outros a de a colher


Miguel Torga, Cântico do Homem