Thursday, January 14, 2016

Notas sobre o socorros de 3 pessoas na Serra do Gerês - Minas dos Carris



Nos últimos dias li muito sobre o socorro de 3 pessoas que "querendo ver a neve" se meteram à serra no meio de uma tempestade e compreenderam da pior maneira que a natureza é muito mais que partilhas no face book.  Nessas leituras encontrei abordagens de muitos temas interessantes [a questão da visitação  do PNPG, com a esquizofrénica diferença entre a situação "de facto" e a situação "de jure" na visitação criada pela conjugação do POPNPG e taxas do ICNF; a falta de cultura desportiva de montanha; as questões de segurança na pratica de atividades de montanha; ...] e os habituais comentários críticos e insultuosos. Só que nestas notas apenas quero abordar a questão da organização do socorro.

É que, admirando os operacionais que subiram a serra para resgatar a vitima  em hipotermia (julgo saber que foi comunicado à proteção civil que havia uma pessoa em hipotermia), faço parte dos que não compreendem os 80 homens e 14 viaturas mobilizadas e se questionam sobre a gestão e coordenação da proteção civil.

Sobre as circunstâncias do resgate, no blogue do Rui Barbosa existe um bom relato e recomendo a sua leitura para a contextualização do caso.

No mapa assinalei o que julgo terem sido os percursos dos bombeiros de acordo com a s informações que recolhi. Assinalado a verde marquei o possível percurso pedestre desde a Lagoa do Marinho realizado pelos bombeiros até á vitima.  A vermelho o  percurso de evacuação desde as minas até à estrada florestal de acesso à fronteira. Sei que o socorro da vítima obrigou a um transporte em maca e que as outras duas pessoas desceram pelos seus próprios meios. Os 3 montanhistas que deram o primeiro apoio, ajudaram também na evacuação e, pudendo andar mais rápidos, com eles desceu o mais jovem dos 3 em dificuldades. Com os bombeiros desceu, de maca, a vítima em hipotermia e o outro membro do grupo. Na fase final, não sei onde foi o ponto de encontro, os GIPS apoiaram os bombeiros no transporte da maca.

Sobre a coordenação do resgate tenho a dizer:


Eu percebo que tenham começado o resgate com carros e homens a partir das Lagoas do Marinho (Montalegre) [ponto 2 no mapa], que se situa a +/- 6 kms das minas) e que tenham chamado os bombeiros mais próximos (de Salto -Montalegre?). Percebo que se tenha optado por levar a vitima pelo Vale do Homem desde o abrigo [ponto 1] até ao [ponto 3], pois de lá seria mais fácil e rápido o transporte para hospital de fosse necessário. Percebo, portanto, a mobilização de alguns meios de Terras de Bouro. Percebo que descer o vale do homem no meio de uma tempestade, de noite, a carregar uma maca deve ser uma tarefa complicada e demorada. Percebo que no transporte da maca fosse feita a substituição da equipa de transporte, pois na descida foram mais de 10 kms e com uma parte inicial muito dura. Percebo que os bombeiros estivessem exaustos na parte final e aceitassem com agrado ser substituídos no transporte pelos GIPS.


Percebendo tudo isto, não percebo o circo montado em torno do socorro. Como o local da vítima era conhecido, os meios necessários seriam apenas para socorro e transporte. Se fosse necessário fazer uma busca todo seria diferente. Chegados ao local os bombeiros puderam confirmar as informações e avaliar melhor a necessidade de mais meios e não consigo perceber os 80 homens e 14 viaturas mobilizadas. A emergência funciona é pacote de tudo incluído? É tudo ou nada?

Julgo saber que mobilizaram apoio psicológico, mas não tiveram qualquer preocupação em respeitar a identidade das vítimas. Como é que apareceram as tvs? Foram chamadas pelos homens perdidos?

A atuação dos GIPS e as notícias sobre a relevância da sua atuação ficam também por explicar. Parece que subiram depois do primeiro grupo, os montanhistas que fizeram o primeiro apoio na serra e o mais jovem dos perdidos, ter chegado e apenas foram substituir não transporte os bombeiros no transporte. Apareceram como os heróis da noite nas tvs e um jornal do dia seguinte diziam que até foram socorrer os primeiros os bombeiros. Admito que estejam inocentes na divulgação das notícias, mas a coisa desagradou aos bombeiros e a proteção civil fica mal no meio disto tudo.

Thursday, August 27, 2015

Notas sobre as brandas da Peneda

vista sobre a branda da Junqueira - Rouças (Gavieira)

A leitura de Construção do Território e Arquitectura na Serra da Peneda. Padrão (Sistelo) e as suas Brandas – um caso de estudo, reprodução, no essencial, da dissertação de Mestrado em Arquitetura de Fernando Cerqueira Barros está a ser bastante esclarecedora e esta publicação serve como revisão da matéria dada.

Já algum tempo que procurava recolher informação sobre a área do PNPG e foi com alguma sorte que descobri, com dois anos de atraso, este livro. Reservei-o para as férias e tem sido uma das minhas companhias. Não é bem a leitura que se leve para a praia, mas acompanha bem os momentos do café enquanto a Maria não me chama para outras brincadeiras.

Sendo baseado num trabalho académico a  sua leitura é fácil e recomendo-a a todos os que se interessam pela interpretação da paisagem em complemento às atividades de pedestrianismo. Percorrer a serra não deve ser apenas uma atividade física e devemos ter curiosidade pela história do território que percorremos. Ainda que compreenda a simples “voluptuosidade da fadiga”[1], dela disfrute e necessite,  entendo que deve haver um prazer intelectual a acrescentar aos restantes.

A Serra da Peneda[2], dentro do PNPG, não é um dos territórios que percorra mais vezes, mas durante alguns anos cumpri o ritual de no Natal de subir ao Alto da Predada e comer Bolo Rei na Branda da Cova. O Gerês, a Amarela e o Barroso tem a minha preferência, mas gosto também de visitar o Soajo, a Penda e o Planalto de Laboreiro. 

Por motivos vários, entre os quais a necessidade de um período de nojo pelas consequências catastróficas do incêndio de 2006, fui espaçando as visitas ao Soajo. À Branda da Chã da Cova regresso sempre com alegria, é um dos primeiros locais onde tenciono levar a Maria mal ela tenha alguma autonomia, mas ficarei para sempre órfão do caminho que partindo da branda da Travanca nos levava à zona alta através da branda de Curral Velho.
caminho da Travanca após incêndio de 2006

Quanto ao vale de Sistelo, considero-o uma das paisagens mais bonitas do Minho[3] e nunca percebi a sua não inclusão no PNPG. Pesa sobre este vale a ameaça de construção de uma mini hidroelétrica e, para já as notícias são tranquilizadoras, espero que esta paisagem consiga manter-se intocada.

No que respeita à informação que procurava, tinha, entre outras, duas grandes curiosidades: a de perceber porque as brandas na Peneda possuem sempre diversos cortelhos; os topónimos e a localização das inúmeras brandas. No livro terei encontrado a resposta para as duas questões, mas para já tratarei apenas a segunda.


Sobre as Brandas~

De acordo com o dicionário Priberam, Branda[5] é o substantivo feminino que, no Minho, designa a tapada ou pastagem no alto de uma serra, geralmente em terreno pouco inclinado e junto a um curso de água. A sua existência está intimamente ligado aos movimentos de transumância vertical durante os meses de bom tempo, quando o gado é levado até à serra.

De acordo com Fernando Cerqueira Barros, na Serra da Peneda é o nome dado aos núcleos existentes, não em continuidade com os lugares (ou aldeias), sendo complementares a estes. Tem um uso preferencialmente estival e destinam-se à prática agrícola e/ou do pastoreio e podem designar-se por brandas de gado (destinadas exclusivamente ao pastoreio), brandas de cultivo (centeio e batata, associando-se ainda a função pastoril, podendo, por isso também, ser designadas de brandas mistas) ou brandas com maior permanência.

Em Castro Laboreiro, com características próprias, é a designação dos locais habitados desde meados dos finais do mês de Março até à primeira quinzena do mês de Dezembro.

Etimologicamente a palavra branda está muito próxima de braña usado no noroeste espanhol, onde aparecem ainda as variações brañizas, brañales, pastizales, puertos altos, branizas. Na zona dos pireneus aragoneses são ainda comuns os termos estivar, estivejar, estiva, estivada, numa associação ao período estival.

É provável que derive do latin veraneam (pastos de Verão) ou do latin veranian (habitado durante o Verão), mas há autores que defendem a sua origem no céltico brakna (prado húmido)[6]. Sendo que todas estas hipóteses remetem para a estação quente ou para o uso pastoril.

Considerando a localização geográfica, de certa forma coincidente com o da cultural castreja; as semelhanças construtivas dos abrigos de falsa cúpula com as construções da cultura castreja;  que os castros murados seriam complementados com abrigos dispersos pelos vales e planícies utilizados, temporariamente, por pastores e cultivadores; a origem cética do vocábulo pode ser mais do que uma fantasia dos defensores da “celticidade”.

Como Fernando Cerqueira Barros recorda na “área em estudo [a Serra da Peneda], zona montanhosa, que como vimos não foi atravessada por calçadas romanas, nem ocupada de forma efetiva, podemos supor que tenha sido um dos territórios rurais onde se manteve o direito comunitário céltico sob a forma de livre pastoreio ou de baldio, com uso regulado pelo costume, cujos restos ainda chegaram aos nossos tempos, especialmente em zonas serranas.”

No entanto, é no período da reconquista com a fixação das populações nas zonas das várzeas que o modelo de lugar e branda se terá começado a organizar e compartimentar a serra.

Segundo Fernando Cerqueira Barros, “a natureza do solo, com acidentes vários no relevo e uma grande altitude, não permitiu que as populações se fixassem nas zonas centrais da Serra. Por isso mesmo, observamos um anel de povoamento fixo situado nas zonas de vale e a meia encosta, ficando assim as de maior altitude livres de qualquer aglomerado habitacional fixo. Foram estes os fatores que potenciaram a exploração, por parte dessas mesmas populações, das zonas mais elevadas. Terrenos de uso difícil (ou até mesmo impossível) no Inverno, mas que no Verão se tornam apetecíveis para a prática da pastorícia (aproveitando os excelentes pastos das chãs de altitude, numa primeira fase)”.

modelo de ocupação da montanha em anel

Se atendermos aos efeitos do que os cientistas chamam a Pequena Idade do Gelo[7], com Invernos muito mais rigorosos que os atuais, durante a qual as partes mais altas da serra estariam longos períodos cobertas de neve, será mais fácil compreender as dificuldades que, particularmente nestes territórios, o Inverno acrescentaria.


As Brandas

I - Brandas de Gado

branda da Chã da Cova - Soajo (Soajo)

As brandas terão começado por serem todas destinadas exclusivamente ao pastoreio, mas a introdução do milho “maiz” alterou o uso dos terrenos mais próximos do lugar e algumas das brandas. Estas brandas tem alguma similitude estrutural e arquitetónico com os exemplos das serra Amarela e Gerês, denominados de currais.
Estas brandas possuem normalmente diversos abrigos de pastor em falsa cúpula (os cortelhos) e bezerreiras (os muros delimitadores).
Não possuem função de habitação, existindo apenas pernoita.

Freguesia da Cabreiros
  • Vilar – Chã de Abade / Branda da Cerradinha / Carvalhal / Curromadela (Colmadela)
  • Tabarca e outros lugares – Branda de Lamelas / Branda do Arieiro
Freguesia de Gondariz
  • Lombadinha – Branda da Lombadinha
Freguesia de Carralcova
  • Vários lugares – Branda de Bostejões / Alto das Bezerreiras
Freguesia de Cabana Maior
  • Vilela das Lajes – Branda da Travanca / Curral Velho
  • Bostelinhos e Bouça Donas – Branda da Bragadela / Branda dos Bicos / Branda de Burzavô
Freguesia do Soajo
  • Adrão – Curro da Velha / Tieiras
  • Soajo (vila) – Chã da Cabeça / Chã da Cova / Chã da Matança / Felgueira Ruiva
  • Cunhas / Várzea / Paradela – Branda ou Poulo da Seida
Freguesia da Gavieira
  • Tibo – Cabeço de Runfe / Curro da Velha / Canto do Corno
  • Tabarca e outros lugares – Branda de Lamelas / Branda do Arieiro


 II - Brandas de Cultivo
Branda do Alhal - Padrão (Sistelo)

Com a chamada “revolução do milho” os terrenos mais próximos do lugar, ou eido, foram adaptados à nova cultura e, para os terrenos mais altos, inadequados para o milho “maiz” foram transferidas as outras culturas (centeio e batata numa segunda).
As brandas de cultivo são uma segunda geração de brandas que se caracterizam por serem espaços destinados a algumas culturas (principalmente milho e batata) mantendo também funções ligadas ao pastoreio.
Estas brandas situam-se normalmente próximas do lugar e a altitudes até os 550m. Nas brandas mais próximas da aldeia normalmente não existia a função de pernoita. A sazonalidade do uso destas brandas também não é constante. Os lugares de Vilarinho das Quartas e Adrão possuem brandas a cotas inferiores ao dos lugares.

Freguesia de Sistelo
  • Porta Cova – Branda de Crastibô / Branda da Lapinheira / Branda do Furado
  • Padrão – Branda do Alhal / Branda da Gêmea
  • Sistelo – Branda do Braçal / Branda do Rio Covo
Freguesia de Cabreiro
  • Lordelo – Branda do Rodrigo / Branda do Real
  • Avelar – Branda de Avelar (ou Avelar de Cima)
Freguesia de Gondariz
  • Lombadinha – Branda de Bostejões
Freguesia Carralcova
  • Vários lugares – Branda de Bostejões
Freguesia do Soajo
  • Adrão – Branda da Bordença / Branda da Assureira
  • Soajo (vila) – Branda de Murço / Branda de Lapas / Branda de Ínsuas / Branda da Trapadela / Branda de Reigada / Branda de Lume na Eira
  • Cunhas – Branda do Ramil
  • Várzea ­– Branda das Ínsuas
  • Paradela – Branda de Rendufe
  • Vilar de Suente – Sedas


Brandas com maior permanência


branda da Junqueira - Rouças (Gavieira)

Nestas brandas há uma função habitacional que entre os Maio a Novembro que se torna em estadia. Neste período, a maior parte da população do lugar para lá se deslocava com o gado e se ocupava do cultivo de centeio e da batata. É possível estabelecer algumas semelhanças com as brandas de Castro Laboreiro, mas na freguesia de Gavieira a mudança nunca é total e são apenas uma estrutura complementar do lugar. Ao contrário de Castro Laboreiro a melhor habitação não se situa nas brandas e era no lugar onde se plantava o milho. Há ainda a particularidade de as referências históricas às brandas serem normalmente muito anteriores à dos lugares.

Freguesia da Gavieira
  • Rouças – Branda de Gorbelas / Branda da Junqueira
  • Gavieira – Branda Busgalinhas / Branda de S. Bento do Cando
  • Peneda e Beleiral – Branda da Bouça dos Homens
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[1] “De resto, faz parte do meu ritual subir aos altos, sentir a voluptuosidade da fadiga, como diz Unamuno, e depois olhar.” – Miguel Torga, Diário II – 26 de Outubro de 1942
[2] Há quem se ofenda se não se diferenciar a Serra do Soajo da Serra da Peneda, mas porque na obra em questão se utilizou a Serra da Penada como designação mais abrangente será assim que a utilizarei.
[3] Designado na WEB por Pequeno Tibete, mas nunca percebi a origem desta comparação. Pessoalmente julgo que faria mais sentido estabelecer a semelhança com a paisagem peruana. Até porque, de certa forma, são ambas parcialmente resultado da adaptação ao milho.
[4] Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, http://www.priberam.pt/dlpo/branda [consultado em 26-08-2015]
[5] http://mas.lne.es/toponimia/index.php?leer=154&palabra=bra%F1aseca
[6] https://pt.wikipedia.org/wiki/Pequena_Idade_do_Gelo


Nota: todas as fotos foram são minhas e foram realizadas ao longo das diversas caminhadas que realizei pela zona.

Monday, August 24, 2015

Leitura de férias


Na área do PNPG não existem muitos livros que nos ajudem a interpretar a paisagem. Este descobri-o com dois anos de atraso e está a ser uma das leituras de férias. Uma leitura muito interessante que recomendo.

Thursday, July 09, 2015

Uma caminhada circular pelo Vale Teixeira

 Uma prova de que ando a faltar aos treinos, ainda não tinha reparado neste miradouro
O único gado que vimos durante o dia
 Vai um "banhito" fresquinho?
 Parece que sim!
 Na Giesteira descobri uma outra forma de acampar!
 O PNPG vai ter dificuldade em enquadrar isto. Campismo? Pernoita? Ou ainda uma outra coisa
 A beleza serena de uma árvore secular
 Um desvio para espreitar a "praia". Tantas vezes por aqui passei sem tempo para a descobrir
 Um outro olhar sobre a cabana da Giesteira
 A corga da Giesteira. O Maka diz que há caminho, mas ainda não foi desta
 Um grupo a preparar-se para descer o Arado
 Finalmente o vale Teixeira
Curral Teixeira, ainda não conhecia a remodelação. Um luxo!
 Senhora do Camalhão
 Curral do Camalhão
 As árvores morrem de pé! (1)
 As árvores morrem de pé! (2)
 Vale Teixeira visto de Norte (1)
 Vale Teixeira visto de Norte (2)
 Os dois trilhos perfeitamente marcados. O dia nem estava muito quente e ainda equacionamos subir ao Borrageiro para descer pela Giesteira, mas nunca tinha feito a cumeda da Freza ao Junco e venceu a curiosidade
 A Freza ao Longe
 Mais uma vista
 O curral do Camalhão
 Umas mariolas curiosas, para onde guiarão?
 O curral Teixeira na despedida (1)
 O curral Teixeira na despedida (2)
 


 Curral da Lomba do Vidoeiro

 Há anos que ando para seguir estas mariolas
 Um gigante caído
 O miradouro que desconhecia e que nos ajudou a retomar caminho
 Panteão (1)
  Panteão (2)
  Panteão (3)
 Panteão (4)

Thursday, June 25, 2015

O menir Marco de Anta - Germil (Ponte da Barca)

Numa recente caminhada pela Serra Amarela comprovei como é importante estarmos atentos aos pormenores da paisagem. As serras do PNPG guardam muitos segredos e é bom manter a curiosidade. Haverá sempre alguém com quem possamos aprender e felizmente vivemos uma época em que a partilha de informação está facilitada.

É por isso que gosto de caminhar com companheiros que associam ao exercício físico outras componentes. O João Vieira, aka Maka, e o Fernando Fontinha , aka Truka, são dois desses companheiros. Caminhar com eles é sempre mais do que ir e voltar. Há sempre qualquer coisa de descoberta, que tanto pode ser a exploração de um caminho de uma carta antiga como a procura de um local perdido na memória do tempo. Como eu gostam de interpretar a paisagem e saber mais sobre os locais por onde caminham.

 Marco de Anta - face virada a sul
Marco de Anta - face virada a norte
Marco de Anta - face virada a este 
(fotografia de Maka)

A surpresa apareceu-nos numa portela junto a Carvalhinha e na forma de um marco cheio de gravações em todas as faces. Inicialmente, devido à sua localização numa portela e perto dos limites dos concelhos de Terras de Bouro e Ponte da Barca, julguei tratar-se de um antigo marco divisório (ou de termo).

vista sobre o marco

Mais tarde, na ASSOCIAÇÃO PÉD'RIOS (Germil), informaram-me  que se trataria de um vestígio do megalítico e  a toponímia registada na carta nº30, Marco de Anta e Lomba de Anta, parecia confirmar essa informação. Infelizmente não me conseguiram dar mais elementos.

localização do Marco de Anta (carta nº30)

No relatório de caracterização do património histórico-arqueológico do PNPG, parte do processo de revisão do POPNPG, não encontrei qualquer informação sobre o Marco de Anta.

No site do PR Megalitismo de Britelo (PNPG) encontrei uma referência genérica ao Megalitismo na Serra Amarela:
Toda a serra Amarela foi ocupada desde tempos remotos, conhecendo-se hoje vestígios dessa ocupação. Da Idade do Ferro ficaram vestígios do castro da Ermida; da época romana encontramos os povoados de Bilhares, da Torre Grande e do Cabeço do Leijó e a estátua conhecida por Pedra dos Namorados. Em Britelo são as necrópoles megalíticas (conjunto de monumentos funerários) que assumem um maior destaque e cujos diferentes núcleos poderá conhecer. 
Finalmente, num artigo publicado na Revista de Ciências  Históricas, Universidade Portucalense, Vol. III, 1988, pp 11-24: "O Menir de Marco de Anta (Ponte da Barca), de Silva, E.J.L.; Silva, E.M.M.; Ribeiro, J.D.A., encontrei a informação que buscava sobre o local.

De acordo com o autores, o marco poderá ter sido em épocas recentes aproveitado para balizar os limites de territórios e importava comprovar se o menir terá tido sempre a sua implantação atual. No entanto, tudo aponta que seja pré-histórico e que tenha sido objeto de culto litolátrico.

As cruzes, ainda que por vezes apareçam ligadas a marcas territoriais ou como símbolos de cristianização, num esconjuro de cultos pagãos,  serão no caso cruciformes ligados à arte rupestre de ar livre, de cunho pré-histórico. Até porque em algumas faces também são visíveis alguns "fossetes" que reforçam a datação como sendo do megalítico.

Nas pesquisas encontrei ainda referências a um monolítico designado por "Pedra das Cruzinhas" que apresenta semelhanças enormes nas gravações cruciformes. Sobre a Pedras das Cruzinhas considera-se que:
A associação de motivos, cruciformes simples, covinhas e antropomorfos, que se observa na Pedra das Cruzinhas não constitui novidade, sendo muito comum na arte rupestre do território continental, principalmente na chamada área noroeste. Porém, no “nosso” exemplar não se observam outros motivos comuns em conjuntos similares, como antropomorfos em phi, antropomorfos com mãos figuradas, cruciformes com base triangular ou circular, formas geométricas variadas, ferraduras, podomorfos e alfabetiformes, indicando a reduzida diversidade iconográfica da Pedra das Cruzinhas e, quiçá, uma menor dispersão temporal. Contudo, a monotonia que lhe poderia ser conferida pelo domínio dos cruciformes simples é quebrada pelas inúmeras coalescências, laterais e verticais, entre esse tipo de figuras, aspecto comum a muitos outros conjuntos estudados no território português.
Quando e que funções desempenhou a Pedra das Cruzinhas com as suas múltiplas gravações? Esta é a pergunta de resposta mais difícil. 
Quanto à sua antiguidade seria sensato escudarmo-nos nas indecisões e nas disparidades de opiniões (22) acerca do tempo das figuras cruciformes, ora consideradas como representações antropomórficas, pré-históricas ou proto-históricas, ora assumidas como marcas medievais ou modernas, seja de cristianização de sítios de antigos cultos pagãos, seja de materialização e confirmação de limites de territórios. 
No caso da Pedra das Cruzinhas não rejeitamos esta última hipótese, a de ter servido como marca de termo, mas apenas como sucedâneo ou reutilização moderna, resultante da circunstância da pedra se situar em local sobre o qual foi estabelecido o limite administrativo que hoje separa a Guarda do Sabugal. E o facto de não termos datas, que melhor poderiam indicar momentos de confirmação dessa fronteira, não impede que a Pedra das Cruzinhas tivesse desempenhado tal função. As confirmações de limites, documentadas em inúmeros locais, alguns dos quais já citados neste texto, têm um exemplo bem próximo, no concelho da Guarda, no sítio do Fontão, num conjunto de afloramentos gravados com cruciformes, três datas (1700, 1699, 1855) e uma legenda nomeando a freguesia de Vela (Caninas et al, 2008). 
 A densa carga gráfica inscrita na Pedra das Cruzinhas tem de ter outra explicação primordial, talvez fortemente ritual. Seria tentador estabelecer, também aqui, uma periodização dos grafismos, invocando uma antiguidade pré-histórica (tardia) ou proto-histórica para o antropomorfo ictifálico, juntamente com as covinhas (23) situadas no topo da peça, remetendo os restantes cruciformes para momento posterior. Invocar o contexto proto-histórico (24), expresso na rede de povoamento referida no início e na proximidade do sítio (atalaia?) do Cabeço da Figueira, ao qual se acederia passando junto da Pedra das Cruzinhas, também não é fundamento suficiente na atribuição de cronologia proto-histórica ao monumento em apreço. A prudência aconselha-nos a procurar resposta a estas questões mediante a escavação do local de implantação da Pedra das Cruzinhas, na busca de outros dados, bem como do montículo situado nas proximidades, para confirmar se corresponde a uma sepultura pré-histórica.
 No caso do Marco de Anta a toponímica adjacente (Lomba de Anta) sinaliza a existência próxima de uma sepultura pré-histórica.

desenho técnico do menir - Maria Teresa Fonseca