Um dia alguém me disse: “quando uma palavra começa a ser muito usada o normal é que o seu sentido esteja a ser deturpado”. Ao longo dos tempos tenho confirmado como este “postulado” parece bater certo. Assisti também à ascensão e queda de muitos dos “palavrões” oficiais.
A “certificação”, “inovação”, “empreendorismo”, “transfronteiriço”, “internacionalização” e muitas outras que já esqueci foram, ou ainda são, vendidas como receitas mágicas para resolver todos os problemas do mundo. Seriam como uma forma adulta da palavra mágica “Perlim-pim-pum” ou então chaves diferentes para grutas de riquezas prometidas. Depois, na fase descendente, são apenas palavras repetidas por modismo, fé ou coisa pior. Os ciclos foram/são normalmente marcados pelos ciclos oficiais de candidaturas a apoios e projectos. Os consultores julgam sempre saber qual o palavrão chave em cada momento e a ciência nem é complicada. Basta estar atento aos discursos oficiais.
Os últimos tempos políticos parecem ter juntado “ética” ao rol. È que não me recordo de ouvir tantas vezes a palavra ética no discurso político. Tendo é conta o “postulado” acho que temos razões para ficar preocupados. Um exemplo do postulado parece ser a recente invocação da “ética da responsabilidade” de forma aparentemente contraditória em dois momentos diferentes e por políticos diferentes.
O presidente invocou-a para justificar que foram as circunstâncias que se impuseram. Como quem diz, ele, se exercesse a “ética de convicção”, teria decidido diferente. Tal como Max Weber explicava, parece ter ficado prisioneiro do dilema entre “convicções pessoais e adopção de comportamentos orientados pelas circunstâncias”.
O Primeiro-Ministro invocou-a para justificar a necessidade de apoiar um candidato. Ou seja, apoia mas contra as crenças e suposições pessoais. Só que de seguida, afirmou o apoio em nome dos valores e convicções. Será a denegação implícita uma contradição premeditada. Ou, por hipótese mais benigna, será um lapso ou deturpação?
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