vista desde o Altar de Cabrões - http://bordejar.com/2009/03/altar-de-cabroes/
localização de Altar de Cabrões na antiga carta 31 (na linha de fronteira)
localização de Altar de Cabrões na moderna carta31 (em Espanha)
Altar de Cabrões, 9 de Agosto de 1944 – Estou a mil e quinhentos e trinta e seis metros, perto do céu, a ver o Barroso, o Marão, a Peneda, a serra Amarela e o Lindoso. Estou sentado num marco que separa Portugal de Espanha, mas o sítio chama-se Altar de Cabrões e foi, como se vê, o olimpo de majestades cornudas, a ara de alguns daqueles sagrados deuses lusitanos, de que só restam nomes e cascos. Cada vez sei menos de rezas e de santos. Mas quando pressinto pegada de velho Endovélico, tenho logo vontade de me prosternar e benzer. O catolicismo, sem o Cristo querer, encheu este mundo de cruzes e água benta. Ora estes nossos patrícios deuses de chifres eram portadores de uma virilidade mágica, que não nega nem degrada a natureza. Nada de agonias lentas em madeiros de cedro. Água, frutos, sol, e uma divindade fundamentada na verdade feiticeira das coisas. Miguel Torga, “Diário III”
Uma entrada recente do Rui Barbosa no blogue Carris em que tratava o topónimo Iteiro de Ovos levou-me a voltar a uma referência biliográfica que confirmava a sua explicação para a origem do topónimo Iteiro. Diz o Rui que Iteiro é "uma variante dialectal de outeiro, oiteiro e eiteiro" (fonte), "pequena elevação de terreno. Normalmente um cerro/morro que se destaca como acidente de terreno. Em várias regiões serviam como limites, términos, marcos da confluência de diferentes territórios, em particular nas civilizações pré-romanas. É esse o significado toponímico de Itero em Castela e Leão" (fonte). Uma explicação que me parece lógica e que ainda recentemente tinha lido no livro "Montalegre" de José Dias Baptista: "É significativo que a povoação se aglomere sobre o Outeiro, Oiteiro, Eteiro, Iteiro, que tudo é um e significa o sítio do altarium, o altar". Concordando, que para o local, o topónimo mais certo derivará do relevo do que qualquer divinização pagã. Mesmo que por lá também se sinta a "divindade fundamentada na verdade feiticeira das coisas" de que Torga falava.
Conecei depois a refletir no topónimo Altar dos Cabrões e, ainda que me pareça uma explicação demasiado erudita, talvez não seja de excluir que "altar" tenha a mesma origem e não qualquer significado ligado ao "sagrado". Talvez seja apenas mais uma forma de refletir o relevo. De onde Altar dos Cabrões se explicaria por ter sido uma elevação onde seria normal encontrar os ditos.
Uma explicação que até estaria correcta com o que se sabe ter sido o antigo território das cabras selvagens (que agora estão novamente a reclamar para si).
Altar de Cabrões tem ainda outra curiosidade. Quem ler Miguel Torga e o confrontar com a moderna carta 31 não perceberá a sua localização na linha da fronteira. Eventualmente atribuirá o erro a uma liberdade do poeta que teria preferido localizar-lo no marco (o da fotografia) onde se sentava e fará a localização uns 400 metros a Norte, já em Espanha. Consultando a versão da mesma carta (31) numa data mais próxima do dia da escrita do Diário - a entrada corresponde ao dia de 9 de Agosto de 1944, pode-se comprovar que não foi assim. Miguel Torga terá simplesmente seguido as indicações do guia ou populares para designar o local. Os critérios topográficos é que se alteraram e este é afinal mais um dos muitos exemplos da dinâmica da toponímica serrana. Vulgarmente é a este pico que se continuam a chamar Altar do Cabrões, até porque não faz sentido que haja um topónimo nacional para designar um local fora do território. Ainda que a linha de fronteira também foi ela sofreu alterações ao longo dos tempos e isso pudesse explicar a existência do topónimo.
Nota: sobre a linha de fronteira foi-me dito recentemente que a primeira das trincheiras do Gerês estaria localizada perto da Corga da Fecha. Uma informação que tentarei confirmar e voltar a ela mais tarde.
Uma explicação que até estaria correcta com o que se sabe ter sido o antigo território das cabras selvagens (que agora estão novamente a reclamar para si).
Altar de Cabrões tem ainda outra curiosidade. Quem ler Miguel Torga e o confrontar com a moderna carta 31 não perceberá a sua localização na linha da fronteira. Eventualmente atribuirá o erro a uma liberdade do poeta que teria preferido localizar-lo no marco (o da fotografia) onde se sentava e fará a localização uns 400 metros a Norte, já em Espanha. Consultando a versão da mesma carta (31) numa data mais próxima do dia da escrita do Diário - a entrada corresponde ao dia de 9 de Agosto de 1944, pode-se comprovar que não foi assim. Miguel Torga terá simplesmente seguido as indicações do guia ou populares para designar o local. Os critérios topográficos é que se alteraram e este é afinal mais um dos muitos exemplos da dinâmica da toponímica serrana. Vulgarmente é a este pico que se continuam a chamar Altar do Cabrões, até porque não faz sentido que haja um topónimo nacional para designar um local fora do território. Ainda que a linha de fronteira também foi ela sofreu alterações ao longo dos tempos e isso pudesse explicar a existência do topónimo.
Nota: sobre a linha de fronteira foi-me dito recentemente que a primeira das trincheiras do Gerês estaria localizada perto da Corga da Fecha. Uma informação que tentarei confirmar e voltar a ela mais tarde.
No comments:
Post a Comment