Sunday, January 18, 2009

O baldio de Cabril


"O director quis minimizar o conflito. O baldio do Cabril, onde ainda há centenas de cabeças de gado, foi já retirado da ZPT" - JN (2009-01-02)

baldio de Cabril


O baldio de Cabril estende-se ao longo de terrenos do Parque Nacional da Peneda-Gerês pertencentes ao Conselho de Montalegre, mais propriamente ao longo freguesia de Cabril, que lhe dá o nome. O mesmo desenvolve-se segundo uma faixa praticamente contínua e assimétrica, em cujos limites correspondem, a norte, à linha de fronteira com Espanha, e a sul e sudeste, o leito do rio Cávado, compreendido entre as albufeiras de Paradela e de Salamonde.

A sua extensão segundo os azimutes este – oeste pode considerar-se bastante variável, pois, nos sectores situados mais a norte o baldio tende progressivamente, a tornar-se mais estreito. Seja como for, este baldio, tem como extremidades máximas (este – oeste) o Porto da Laje e o Outeiro Redondo.


(Caracterização Geológica e Geomorfológica do baldio de Cabril - Gonçalves, E. Jorge dos Santos)

Saturday, January 17, 2009

Recordação do Poeta


Não sei porque diabo escolheste
Janeiro para morrer: a terra está tão fria.

É muito tarde para as lentas
narrativas do coração,
o vento continua
a tarefa das folhas:
cobre o chão de esquecimento.

Eu sei: tu querias durar.

Pelo menos durar tanto como o tronco
da oliveira que teu avô
tinha no quintal.
Paciência, querido, também Mozart morreu.

Só a morte é imortal.

Eugénio de Andrade (Escrito a 17 de Janeiro de 1995, dia da morte de Miguel Torga)
"Não sei" - do Sal da Língual



Parques e Populações 12

Terminei ontem a publicação do artigo "Parques e Populações: é Possível conciliar? A Experiência de um Parque nacional Europeu" da autoria de Flávio B. Barros. A minha intenção era ajudar a formar uma opinião o relacionamento do PNPG com as populações. O relacionamento das populações com o PNPG herdou todo o enquadramento histórico dos complicados relacionamentos com os serviços florestais. E no Gerês eles foram de tal ordem que ficaram conhecidos pela "Guerra do Gerês". As raízes dos problemas são tão antigas como a implementação do Perímetro Florestal do Gerês em 1888 (os serviços florestais foram criados em 1886). A coincidência entre algumas datas pode até permitir uma interessante leitura da visita da Família Real ao Gerês em 1887. Relacionamento que durante o sec. XX continuou tenso e recheado de casos. A leitura do parecer da CMTB sobre o actual POPNPG permite um bom enquadramento histórico, ainda que de acordos com as teses da CMTB, e é esclarecedor como em 1995 esse relacionamento ainda era complicado.

Aos que defendem que estão em confronto dois interesses distinto, eu respondo que não são necessariamente contraditórios. Diria mais, não podem ser contraditórios. Sendo que, na minha opinião, compete mais a uma, que a outra, a responsabilidade desse entendimento. Eu comecei por ser um "domingueiro". Conhecia do PNPG pouco mais que as estradas. Foi no conhecimento dos montes, das pessoas e da história que formei uma opinião diferente da inicial. O importante é termos a noção que após um passeio pelo Parque, os que gostamos de correr o PNPG "por festa", regressamos sempre ao conforto das cidades. Só que a bem da nossa "festa" o conforto não pode estar apenas no final desse regresso. Às populações dentro do PNPG devem ser dadas as condições de conforto semelhantes ao do resto do território, ainda que respeitando os valores naturais. Se é normal que existam concionalismos especiais no ordenamento do território, devem ser criadas condições para que não se penalize uma população com menos recursos.

O artigo completo poder ser encontrado aqui.

Friday, January 16, 2009

Parques e Populações 11

(publicação parcial do artigo)
Como melhorar o PNPG?


Como já dito anteriormente, a gestão de uma AP, se realizada em parceria com as populações, torna-se menos complicada. Não quero com isso dizer que instituir o diálogo entre as partes é o antídoto da conservação da natureza, mas não adotá-lo contribui muito mais para os retrocessos do que para os avanços. No caso do PNPG é a própria população que denuncia este afastamento que, segundo alguns moradores, é histórico. Refletir a questão do diálogo é, portanto, fundamental, uma vez que o mesmo constituiu-se como uma expectativa da população, nas três áreas estudadas. Para ilustrar esta questão, um residente citou o exemplo dos pesquisadores que realizam estudos no PNPG e que os próprios moradores não conhecem os resultados desses estudos, reforçando ainda mais a idéia de que o Parque é uma instituição distante do seu povo. Se compreendermos que o conhecimento deve ser produzido para a sociedade, temos que nos perguntar para qual sociedade.


Considerações Finais


O modelo de implantação de Parques Nacionais, aquele originado das idéias produzidas inicialmente nos Estados Unidos, até hoje tem suscitado discussões efervescentes. A essência do debate desse modelo está no fato de se questionar se seriam as populações humanas residentes as que deveriam pagar o preço mais alto pela implantação das AP’s, mesmo que a justificativa esteja centrada na idéia de que os recursos naturais e o patrimônio cultural estariam mais bem preservados se fossem intocados. Assim, como diz BENSUSAN (2006), aqueles que degradaram o meio ambiente, continuam onde estão, e ainda ganham os benefícios das AP’s que melhoram sua qualidade de vida e asseguram serviços ambientais que, de outra forma, se perderiam. O PNPG é uma AP que optou, no seu processo de criação, pela permanência das populações após sua implementação. Uma vez que estas populações existem, estas devem ser vistas como parte importante no processo de conservação da natureza. A falta de diálogo com as populações residentes, pelo que os resultados revelaram, parece ser hoje a maior fragilidade do PNPG, e do ponto de vista da gestão de uma AP que legalmente permite populações no seu interior, este distanciamento funciona como um entrave, dificultando os objetivos do Parque. Este cenário, no entanto, tem melhorado nos últimos anos. O PNPG possui vários fatores a seu favor. Dispõe de um quadro técnico permanente, tem disponível um PO legalmente em funcionamento, conta com a boa vontade e a abertura da população para contribuir com o seu sucesso, há em todo território boas condições de acesso (estradas, sinalização, etc.) e alojamento para turistas, entre outros. Em grande parte dos países em desenvolvimento, os Parques Nacionais carecem dessas infraestruturas, não dispondo nem sequer de um instrumento legal de ordenamento e gestão. A criação de conselhos deliberativos por freguesia pode constituir-se como um bom instrumento de tomadas de decisão. É perfeitamente legítimo e importante o processo de revisão do PO do Parque, porém, é fundamental que esse documento, após concluído, se transforme num instrumento prático ao longo de sua vida útil, para que não caia no esquecimento ao passar dos anos.

Thursday, January 15, 2009

Parques e Populações 10

(publicação parcial do artigo)
Principais entraves do PNPG


Identificar as barreiras que impedem a conservação da natureza no PNPG, a partir da visão dos residentes, constituiu um ponto essencial no que diz respeito ao processo de revisão do atual PO, pois são estes os sujeitos que vivem e convivem de perto com a realidade cotidiana do Parque Nacional e consultá-los é no mínimo uma atitude de respeito.

Boa parte dos entrevistados demonstrou hostilidade à existência do Parque Nacional. Esta pouca aceitação, pelo que os dados apontam, parece ter uma origem antiga, que remonta a própria transformação do território em AP. Os sujeitos que reprovam a permanência do Parque, alegam que o mesmo foi criado de forma impositiva, com a promessa de trazer melhorias de vida para os residentes. Dizem ainda que a decisão de criação desta AP foi muito mais uma intenção de uma elite de investigadores e ambientalistas, e também políticos do País, do que propriamente uma iniciativa dos atores locais. Frente a não concretização de promessas feitas na altura gerou-se então conflitos e descontentamentos junto aos moradores. Segundo PINTO & PARTIDÁRIO (artigo submetido), a história da implantação das AP’s em Portugal, de modo geral, assumiu este posicionamento. A decisão de transformar um determinado espaço em AP veio geralmente de um grupo de pessoas que pensou que tais áreas, devido à beleza cênica, o valor cultural e a presença de uma fauna e flora especiais, poderiam estar mais resguardados se passassem a existir como espaços protegidos. Isto, da maneira como se estabeleceu, pode ter sido o âmago do surgimento dos conflitos entre as áreas protegidas e as populações nelas residentes, em Portugal.

Este tipo de embate tem sido uma barreira recorrente para o avanço da conservação da natureza em muitas AP’s no mundo inteiro, principalmente naquelas onde a dinâmica adotada foi a da expulsão das populações humanas de uma área para que esta fosse transformada em Parque. Deste modo, o preço pago para a implantação de Parques em muitos países foi bastante alto.

No caso específico do PNPG observei que, com base nos depoimentos de alguns moradores, o mecanismo pelo qual o Parque tem sido conduzido ao longo dos seus quase 40 anos, ou seja, a partir de uma relação distante com os atores locais, fez nascer nas pessoas um espírito de rejeição, que acaba por recair na figura do diretor, perpassando da esfera institucional para o âmbito pessoal. Isso constitui, no meu entender, um aspecto bastante negativo, pois se reduz um problema complexo a imagem de uma pessoa, esquecendo que esta fragilidade é histórica e institucional e este tipo de posicionamento parece muito mais ser uma postura do tipo – o problema é dos outros e não meu. E, neste sentido, é fundamental que cada sujeito envolvido no contexto do Parque, seja um funcionário, seja um morador, sinta-se co-responsável pela boa condução dos processos mitigatórios dos problemas socioambientais. HAYES (2006), por exemplo, estudando a relação entre os parques e as pessoas em 13 países, por meio da eficácia das AP’s para a proteção da floresta, identificou que a valorização do diálogo é de fundamental importância para o alcance da conservação. Do mesmo modo, XU et. al. (2006) também reforçam esta afirmação.

Wednesday, January 14, 2009

Parques e Populações 9

(publicação parcial do artigo)
Diálogo Populações x Parque

Uma questão emergente, que tem sido discutida com ênfase no cenário mundial, é a dificuldade que grande parte dos profissionais que trabalham em conservação da natureza tem para estabelecer um diálogo com os atores locais. Essa limitação muitas vezes poderia ser minimizada se durante a formação desses profissionais as Universidades considerassem que a conservação não se faz apenas com conhecimento científico, nem no interior de gabinetes ou laboratórios, mas também diretamente com as populações humanas, muitas vezes convivendo com elas e percebendo a complexidade de seus modos de vida. Diversas experiências em AP’s e fora delas, em várias regiões do mundo, têm demonstrado o relevante papel do diálogo entre as populações e as Instituições que lidam com a conservação dos ecossistemas. E esse exercício não é fácil. Muitas vezes só o tempo e as experiências vivenciadas é que trazem potenciais estratégias de mudança em prol da conservação. Principalmente para os profissionais da área de Ciências Naturais, essa carência é sentida mais de perto. Em outras ocasiões, esse distanciamento entre populações e as equipes de profissionais da conservação, pode ser apenas uma questão de postura político-filosófica. Assim, a arrogância e o comportamento de superioridade só contribuem negativamente para os avanços. Neste sentido, o bom senso deve falar mais alto. A timidez e a falta de vocação para lidar com as comunidades, podem se apresentar como barreiras para o corpo técnico que lida com conservação. Assim, há que se reconhecer tais fragilidades e tentar contorná-las pelos meios possíveis, tais como contratação de pessoal com perfil mais sistêmico, a promoção de cursos de formação e mesmo o contato direto com diferentes realidades existentes.

A divulgação permanente do PO junto aos diferentes grupos sociais, a sensibilização e o estreitamento na relação Parque x residentes, são requisitos essenciais para tornar o caminho da conservação da natureza menos longo em AP’s habitadas por populações humanas.

Para solucionar, ou talvez minimizar tais problemas, profissionais que atuam diretamente em AP’sdeveriam passar por cursos de formação na área de Sociologia, Educação ou Antropologia, para perceber métodos e técnicas existentes que facilitam a comunicação entre estes e a sociedade em geral. Não somente essa preocupação tem que se dar nos níveis da oralidade, dos métodos e das posturas, mas também da escrita. Como diz Pombo (s.d.), é preciso olhar e ver a floresta e não apenas as árvores. Muitas experiências bem sucedidas em conservação da natureza passaram a ser realidade na América do Sul e em outras partes do mundo depois que as comunidades locais se tornaram parceiras, reduzindo drasticamente os conflitos. Dessa forma, por um lado os habitantes sentem-se importantes e desenvolvem o espírito de cooperação, e os investigadores, que geralmente estão acostumados a enxergar apenas o seu “objeto de estudo”, passam a encarar o processo de outra maneira, a partir de uma concepção mais sistêmica.

Parques e Populações 8

(Publicação faseada do artigo)

Plano de Ordenamento

O atual PO do PNPG, de 1995, está passando por um processo de revisão sem que a maior parte das comunidades locais tenha se apropriado do seu conteúdo. Neste aspecto, é importante colocar que o PO tem a função de ser um instrumento legal que define as diversas atividades que podem ou não serem desenvolvidas no território. Neste sentido, os inquiridos responderam na maioria dos casos que conheciam ou já tinham ouvido falar sobre o PO, mas que na prática ou conheciam muito superficialmente ou não conheciam praticamente nada sobre o seu teor. Pude perceber este desconhecimento quando sugeria que o entrevistado tecesse algum comentário sobre o Plano, do tipo o que é, como funciona. As freguesias que apresentaram o maior número de pessoas com conhecimento sobre o PO foram Vilar da Veiga (83%) e Castro Laboreiro (78%), ver Quadro II. O caso mais crítico diz respeito a Pitões das Júnias, onde a maioria (55%) dos inquiridos disse não saber do que se trata o PO.

Quadro II: Conhecimento acerca do atual Plano de Ordenamento, por Junta de Freguesia.


Com relação aos resultados apresentados, cabe analisar o porquê destes cenários. Os contextos observados sugerem que a presença do Parque é mais sentida nas duas primeiras áreas. Tais fatores podem estar ligados ao maior fluxo de turistas nessas áreas, maior densidade demográfica, maior número de problemas e como conseqüência desses, maior demanda de ações de fiscalização. Pitões das Júnias, pelo contrário, está mais distante das áreas mais urbanas, não dispõe de uma infra-estrutura turística ao nível das anteriores (serviços, bares, bancos, restaurantes, etc), possui a mais baixa densidade demográfica (226 habitantes, Censo 2001) em relação às outras freguesias (Castro Laboreiro, 249 e Vilar da Veiga, 910, Censo 2001), não possui vigilantes da natureza com designação para a área. O PO é uma das ferramentas essenciais para uma boa condução do processo de conservação da natureza, porém diversas experiências em escala planetária, na prática, têm indicado o contrário. Não é preciso apenas existir o instrumento, mas a prática diária, por meio da participação social nos processos decisórios e a boa gestão, são igualmente cruciais para se buscar a eficácia da conservação da natureza em AP’s.

Tuesday, January 13, 2009

Parques e Populações 7

(publicação faseada do artigo)

Resultados & Discussão
Aspectos econômicos e socioculturais


Um total de 63 pessoas foi entrevistado, conforme o Quadro I. A população é formada essencialmente por pessoas idosas. A partir do século XX a migração teve forte influência na vida das pessoas do Parque. As condições precárias de vida e a falta de política pública para fixação das pessoas no campo foram as principais motivações que impulsionaram os processos migratórios. As principais rotas de destino eram a França, o Brasil, a Suíça, e o Canadá. De modo geral eram os homens que enfrentavam as grandes viagens. Muitos voltavam; outros, não. As
mulheres, que geralmente ficavam, tinham o compromisso de administrar a casa, criar os filhos, cuidar da agricultura e da criação de animais; em respeito aos maridos que partiram, passavam a usar vestes pretas, simbolizando o luto pelo homem que se foi.

Quadro I: Número de entrevistados por sexo nas três localidades do PNPG.


Por conta desse fenômeno, cada vez mais pessoas começaram a migrar, às vezes dentro do próprio País, em busca de emprego, escolas, saúde, lazer, etc. Ao longo do tempo este processo tem se intensificado ao ponto de algumas aldeias já estarem completamente abandonadas. O aspecto religioso é também bastante marcante, sobressaindo-se a religião católica, havendo em praticamente todos os povoados uma Igreja.


Boa parte da população pouco estudou, pois a maior parte da vida era dedicada ao trabalho no campo. Hoje, por conta dos fenômenos já acima mencionados, a população jovem tem vindo a decair a cada ano. O tempo de moradia no Parque variou entre 3 e 76 anos, considerando todas as áreas estudadas, ressaltando que mais da metade (52%) reside na região pelo menos há 30 anos (Figura 2).


Figura 2: Tempo de moradia por freguesia no PNPG.


No PNPG as fontes de renda são oriundas de trabalhos informais/temporários nos restaurantes, estalagens, padarias, lojas, minimercados, estabelecimentos comerciais, cafés, entre outros. A classe empresarial atua principalmente no ramo de restaurantes e pousadas/hotéis, ou atividades voltadas para o turismo. A produção de artesanato, mel, alvarinho, pães, enchidos, são também importantes. A criação de bovino de corte (raça barrosã) é o mais forte ramo de produção pecuária na região. A caprinocultura, ovinocultura, suinocultura e avicultura são outros sistemas de produção existentes, atuando como coadjuvantes.

Monday, January 12, 2009

Parques e Populações 6

(publicação faseada do artigo)

Metodologia

O estudo foi desenvolvido em três freguesias do PNPG: Castro Laboreiro, Vilar da Veiga e Pitões das Júnias, entre Janeiro e Junho de 2007. A localização destas áreas pode ser observada no mapa do PNPG (Figura 1). As referidas freguesias foram escolhidas com base no número de residentes, diversidade de atividades econômicas, diferentes perfis socioculturais, expectativa de identificação de diferentes níveis de problemas, constituindo-se como zonas estratégicas do Parque.

Pessoas-chave foram indicadas inicialmente por funcionários do Parque para responderem aos inquéritos. O interesse e disponibilidade de participar da investigação, o conhecimento da área, envolvimento em organizações sociais, idade mais avançada e tempo de moradia foram as principais características alocadas para se levar em consideração os atores sociais. A entrevista foi o principal instrumento para captação dos dados e esta mereceu ser previamente bastante refletida. Segundo DUARTE (2002), a escolha dos critérios para a seleção dos sujeitos que participam da pesquisa é crucial, uma vez que é deste fator primário que dependerá grande parte do andamento da pesquisa. O tempo da entrevista, o interesse do sujeito, o tipo de pergunta, o estado de humor, muitas vezes podem se apresentar como entraves e o investigador, neste caso, deve estar preparado para pensar estratégias que minimizem tais percalços. Para isso é primordial que o pesquisador, neste caso, tenha um conhecimento mínimo da área a ser estudada, bem como se apropriar de termos específicos, ter conhecimento de alguns costumes e principalmente, conquistar a confiança dos atores locais. Outra questão relevante é quanto ao número de entrevistas, e neste estudo foi preferível tomar tal decisão durante o desenrolar do trabalho, pois é nesse momento que geralmente o pesquisador percebe quando chega o limite. Além dos questionários aplicados, o diário de campo sempre se fez presente, sendo o instrumento de registro das falas dos sujeitos envolvidos no processo. Consoante ao trabalho de campo, algumas técnicas do método da pesquisa participante foram adotadas e estas tornaram-se fundamentais para uma melhor aproximação das comunidades. O método da Antropologia Visual também foi empregado no estudo, de acordo com as orientações de LEITE (2002).

Sunday, January 11, 2009

Parques e Populações 5

(Publicação faseada do artigo)


PNPG: história, aspectos socioculturais e biodiversidade


O PNPG é a única AP inserida na categoria de Parque Nacional no território português. Criado em 1971, possui uma área de extensão que totaliza 69.687 ha, dos quais a menor porção pertence ao Estado e o restante está dividido entre terrenos baldios e áreas privadas. Está localizado no extremo Norte de Portugal (Figura 1), englobando os distritos de Viana do Castelo (Concelhos de Melgaço, Ponte da Barca e Arcos de Valdevez), Braga (Concelho de Terras de Bouro) e Vila Real (Concelho de Montalegre) e compreende quatro serras: Peneda, Soajo, Amarela e Gerês. Foi criado com os objetivos de valorizar a figura humana e os recursos naturais ali existentes, com fins ainda educativos, científicos e, por causa de sua inconfundível beleza cênica, o turismo. É um “Parque para a Paz”, pois faz fronteira com o Parque Natural Baixa Limia-Serra do Xurés, AP localizada no território espanhol.

Os homens, mulheres e crianças viviam até pouco tempo num sistema de alternância de moradia (transumância), onde o fator preponderante era a condição climática. Esta característica era mais visível na Serra da Peneda, particularmente na Freguesia de Castro Laboreiro, mas ao longo dos anos, por conta dos processos de abandono do campo pelas populações mais jovens e, como conseqüência, o envelhecimento da população remanescente, as famílias têm definido apenas um lugar para viver e passar todo o ano, seja inverno, seja verão. Para este sistema de moradia alternada, chamam-se brandas os lugares mais altos da serra e inverneiras as áreas de vales (GERALDES, 1996).
Como na primeira metade do século XX houve um processo migratório muito intenso, onde principalmente os homens partiam para países como França, Brasil, Suíça, Canadá, Alemanha e Austrália, em busca de uma vida melhor, muitos regressavam ricos, outros nem sequer voltavam à terra-natal, ficando muitas vezes as mulheres com a tarefa de criar os filhos e cuidar da propriedade, além de assumirem a condição de viúvas de maridos que nunca retornaram. Por este motivo, a figura da mulher se tornou muito presente nesta região, marcada pela força, coragem e pelo determinismo de dar continuidade ao sistema familiar.

As principais atividades econômicas são a agricultura, a pecuária, a apicultura e o artesanato. Os cereais são a principal produção agrícola, que são guardados numa construção típica da região, conhecida como espigueiro. Por conta da geologia do lugar e das condições adversas, o centeio e a batata, pelo menos até a década de 1990, eram as principais, se não as únicas, produções agrícolas (GERALDES, 1996).

A biodiversidade é caracterizada pela presença de carvalhos, que podem ser classificados como alvarinho ou negral, de acordo com a altitude de ocorrência. O primeiro, Quercus robus, encontra-se em regiões de baixa altitude, em vales quentes. Além dos carvalhos estão presentes a gilbardeira (Ruscus lusitanica), o medronheiro (Arbustus unedo) e o azereiro (Prunus lusitanica). O segundo, o carvalho-negral (Quercus pyrenaica), pode ser visto em áreas de grande altitude, bem como o mirtilho (Vaccinium myrtillus), o azevinho (Ilex aquifolium), o vidoeiro (Betula celtiberica), o teixo (Taxus baccata). Como representantes da fauna, encontram-se nesta AP muitas espécies de peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos, além de inúmeros representantes de invertebrados. São alguns exemplos de vertebrados o corço (Capreolous capreoulous), animal símbolo do Parque.

Figura 1: Mapa do PNPG destacado em verde, mostrando as Serras da Peneda, do Soajo, Amarela e do Gerês. Fonte: www.geira.pt.

Saturday, January 10, 2009

Parque e Populações 4

(pulicação faseada do artigo)

Povos e Parques: um breve histórico

A história da implantação de Parques Nacionais como AP’s remonta desde o século XIX, com a criação do Parque Nacional Yellowstone em 1872, nos Estados Unidos. Este primeiro Parque foi criado com o objetivo de preservar suas belas paisagens “virgens” para as futuras gerações. Em seu ato de criação, o Congresso dos Estados Unidos determinou que a região fosse reservada e proibida de ser colonizada, ocupada ou vendida. O ser humano ali seria um visitante, nunca um morador. Esse modelo foi adotado por muitos outros países e, em vários deles, vigora até os nossos dias (BENSUSAN, 2006). Dentre outros fins que se seguem, os Parques Nacionais, têm como funções, a recreação e educação, a preservação de áreas com singular beleza natural e estética e salvaguardar espécies da fauna e flora, bem como a realização de investigações a fim de conhecer a história natural das espécies e seus processos ecológicos. O que decorre, nesse contexto, é que este modelo, originado a partir de Yellowstone, tinha como uma de suas metodologias de implantação a expulsão de populações humanas dessas áreas de relevante interesse biológico. O fundamento principal era a crença de achar incompatível a presença dessas populações no interior dessas áreas, sendo aquelas uma ameaça para a estabilidade destas. Como dizem TERBORGH & PERES (2002):

“Um dos problemas mais intratáveis enfrentados pelos administradores dos parques é a presença de residentes humanos dentro das áreas protegidas. A questão é exacerbada quando os ocupantes são populações indígenas cujos direitos de ocupação da área são legal ou licitamente reconhecidos pelo governo. Pessoas de todos os tipos, sejam indígenas ou não, representam uma ameaça séria à biodiversidade de qualquer parque, quando seus meios de vida são derivados dos recursos da área protegida. Muitas pesquisas confirmam que os seres humanos e a natureza são incompatíveis…”.

É bem verdade que a União Internacional de Conservação da Natureza (UICN), recomenda enfaticamente a ausência de pessoas em AP’s que se enquadrem na categoria de Parque Nacional, mas há diversos países onde a presença de comunidades humanas é uma realidade; a exemplo do PNPG. Com relação a tão polêmico assunto, há correntes que postulam contra ou a favor desse posicionamento. Os que se enquadram favoravelmente argumentam que mesmo uma pequena população que resida em uma unidade de conservação não pode e não deve ser privada do acesso aos bens de consumo, à educação, à saúde e à tecnologia (BENSUSAN, 2006), atributos que a priori estão longe de serem alcançados para os residentes de uma AP. É interessante questionar, neste contexto, que idéias permeiam as pessoas com relação ao que se chama de educação, saúde e tecnologia. Na Amazônia brasileira é importante destacar que existem modos complexos de organização social com sistemas de ensinamento de técnicas de todo o tipo (sem que seja um ensino formal) e no âmbito da saúde, em populações tradicionais, que habitam AP’s ou não; ou seja, os próprios indivíduos organizam seus sistemas considerando suas tradições e crenças. É óbvio considerar que o acesso à educação é um direito de todos, mas é preciso refletir como se deve proceder a esse processo, não esquecendo de levar em conta todas as complexidades inerentes aos espaços e a história de vida de cada povo. Há antropólogos e profissionais da área de saúde do mundo inteiro interessados em apreender as os saberes de populações indígenas em relação ao uso de plantas medicinais. Assim, a partir de tal argumento, seria interessante engendrar uma reflexão a respeito do que vem a ser educação, saúde e tecnologia, pelo menos para estes povos ditos tradicionais. Outra questão não menos preconceituosa é a crença de que o “nosso” modo de vida, aquele que está intimamente ligado à cidade, é o melhor. Por outro lado, há os defensores da permanência de populações humanas em AP’s. Para estes existe a possibilidade real dessas populações fazerem o uso racional dos recursos naturais e a convicção de que a conservação ambiental não pode ser concebida de forma separada das outras políticas do Estado, nem dos direitos humanos, ou seja, não é possível desalojar as pessoas da unidade de conservação e dar a questão por encerrada (BENSUSAN, 2006). Em relação a esta discussão, PEDROSO-JÚNIOR e SATO (2005), em experiência de trabalho de cunho etnoecológico, sugerem, que o resgate e a valorização dos conhecimentos das populações tradicionais aliados ao levantamento das problemáticas que estão interferindo negativamente na qualidade de vida como também de meios e alternativas para solucioná-las, são instrumentos úteis para o planejamento e o manejo de uma AP.

Para alguns cientistas, principalmente aqueles com formação tradicional, a presença humana nas AP’s é impossível, e ponto final. Então, estas AP’s servem para estarem lá, intocadas. E precisam ser contempladas, vistas como territórios selvagens, como um mito da natureza intocada, visitadas por turistas que há muito perderam o contato com a natureza nas grandes áreas urbanas do Planeta. Merecem, ainda serem estudadas e entendidas a partir de seus complexos sistemas ecológicos. Essa forma de pensar pode estar vinculada ao modo como as Universidades reproduzem, talvez de modo mais moderado em tempos de Terceiro Milênio, um ensino baseado no pensamento cartesiano, fragmentário, onde os entendimentos dos fenômenos são produzidos de modo compartimentalizado, sendo esquecida ou deixada lado a visão do todo, das relações, do mundo como uma rede de integração com o cosmos. Se pensarmos assim, como então “poderemos” conceber pessoas em AP’s? DIEGUES (2001), JOHANNESEN (2007), neste sentido, discutem sobre algumas experiências que envolvem populações e AP’s.

Muitos pensadores contemporâneos, como Edgar Morin, Frijot Capra, Boaventura de Sousa Santos e tantos outros discutem e sugerem a possibilidade do pensamento complexo, da interdisciplinaridade, do holismo, como forma de pensar e viver no mundo, inclusive fazer ciência. Muitos programas de conservação obtiveram mais sucesso quando os proponentes desses programas integraram os atores locais em suas metas. Por esta razão, cada vez mais biólogos, ecólogos, geógrafos, conservacionistas e pessoas que atuam em conservação da natureza estão se tornando sensíveis e abertos às questões sociais que envolvem a realidade das AP’s.

Muitas experiências têm mostrado a catástrofe que foi a exclusão de muitas populações, indígenas ou não, sobretudo na África e no continente americano. Muitos investigadores e gestores de AP’s na contemporaneidade têm se voltado para repensar a relevante contribuição que algumas populações humanas tiveram (e têm) para a conservação. Reconhecem, por exemplo, o valor intrínseco das tecnologias utilizadas para o uso dos recursos naturais, a manutenção da biodiversidade, a cultura fortemente atrelada ao uso da biodiversidade, os conhecimentos ecológicos tradicionais, etc. Neste contexto, VIVEIROS de CASTRO (2002) denominou a Amazônia de “Floresta Cultural”, por perceber a importância das populações tradicionais para a manutenção da biodiversidade, que desde séculos passados têm contribuído significativamente para a manutenção e equilíbrio de muitas áreas e que para estes povos os seus territórios não são vistos como selvagens, mas como sua casa.

Friday, January 09, 2009

Parque e Populações 3

(publicação faseada do artigo)


Introdução


A discussão sobre a permanência de populações humanas no interior das AP’s é ainda bastante polêmica, e, em pleno limiar do século XXI, este assunto tem suscitado a atenção de gestores, pesquisadores, ambientalistas e grande parte da sociedade civil. Historicamente as políticas de conservação da natureza na maioria dos países têm considerado o afastamento das pessoas de seus territórios, a fim de torná-los espaços preservados. Contrariando esta idéia, algumas correntes da teorização conservacionista contemporânea, defendem que a permanência das pessoas em seus espaços naturais contribui com a manutenção da biodiversidade e de outros recursos naturais, isso, quando estas mantêm modos de vida de baixo impacto sobre o ambiente. Alguns estudos vêm mostrando que, em determinadas situações, a expulsão das populações tem um impacto negativo no equilíbrio da biodiversidade local, principalmente em países tropicais. Assim, no sentido de melhorar a política de conservação da natureza e de aperfeiçoar o seu Plano de Ordenamento (PO) do Território, o PNPG, em Portugal, iniciou uma série de estudos a partir de 2006, onde a valorização dos conhecimentos locais e a participação da sociedade nestes estudos têm sido priorizados. A pesquisa realizada teve como objetivos: identificar os principais aspectos sociais das populações residentes no PNPG; destacar os principais entraves socioambientais enfrentados pelos atores locais; identificar o nível de relação e pertencimento desses atores com o PNPG e identificar as propostas de melhoria para a política de conservação do Parque, com ênfase no PO. O presente artigo, portanto, tem como meta socializar a experiência de um trabalho de caráter socioecológico realizado neste Parque, enfatizando os elementos que funcionam como entraves no processo de consolidação da conservação da natureza, bem como as possibilidades de alcance desta conservação.

Thursday, January 08, 2009

Parques e Populações 2

(publicação faseada do artigo)

Parques e Populações: é Possível Conciliar? A Experiência de um Parque Nacional Europeu
Flávio B. Barros (1) ; Luís A. de Matos Vicente (2) & Henrique M. Pereira (2)

(1) Professor da Universidade Federal do Pará (UFPA) – Campus de Altamira. Pesquisador do Laboratório Agroecológico da Transamazônica (LAET). Doutorando em Biologia da Conservação pelo Centro de Biologia Ambiental (CBA) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.(2) Professor e Pesquisador do Centro de Biologia Ambiental da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Resumo

A discussão sobre a permanência de populações humanas no interior das áreas protegidas (AP’s) ao redor do mundo é ainda bastante polêmica, e, em pleno limiar do século XXI, este assunto tem suscitado a atenção de gestores, pesquisadores, ambientalistas e grande parte da sociedade civil. Alguns estudos vêm mostrando que, em determinadas situações, a expulsão das populações tem um impacto negativo no equilíbrio da biodiversidade local. O presente artigo tem como objetivo socializar a experiência de um trabalho de caráter socioecológico realizado no Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG), em Portugal. Este Parque é a única AP portuguesa classificada como Parque Nacional. O trabalho foi desenvolvido entre Janeiro e Junho de 2007, envolvendo três comunidades. Pessoas-chave foram indicadas inicialmente por funcionários do PNPG para participarem do estudo. A entrevista foi a principal ferramenta para coleta dos dados. Técnicas da Antropologia Visual também foram empregadas. Um total de 63 pessoas foi entrevistado em três viagens de campo. A maior parte dos sujeitos entrevistados já tinha ouvido falar do Plano de Ordenamento, mas desconhecia sua função. Entre os vários problemas enfrentados pelo PNPG, dois serão destacados neste artigo: a falta de diálogo e a ausência de informação; fragilidades que nos últimos dois anos têm sido minimizadas a partir de uma nova concepção de gestão nesta AP.

Parques e Populações 1

Nos últimos tempos tenho acompanhado algum do debate que se está a fazer sobre o PNPG. Ainda que tenha sobre ele algumas opiniões pessoais, é minha intenção partilhar aqui um artigo que descobri recentemente. Decidi fazê-lo sem qualquer comentário e na grafia original do autor, um pesquisador do Laboratório Agroecológico da Transamazônica.

O artigo chama-se "Parques e Populações: é possível conciliar? A experiência de um Parque Nacional Europeu" e resulta de um trabalho de campo realizado no PNPG. São ainda autores do artigo Luís A. de Matos Vicente e Henrique M. Pereira, o director do PNPG. Para facilitar a leitura a publicação será realizada em diversos "post". Espero que a leitura possa ajudar a formar uma opinião sobre este debate.