Saturday, December 10, 2011

Algumas fotografias de Vilarinho da Furna


Estas fotografifias eram do meu pai. Desconheço a sua história e como as recebeu. Encontreia-as há algum tempo quando remexia fotografias antigas e outras papeladas. Imagino lhe tenham sido oferecidas por alguém sabendo que tinha visitado a aldeia de Vilarinho da Furna em momentos próximos dos retratados. Partilho-as no primeiro aniversário da sua morte em recordação do que gostava em vida.

Friday, December 09, 2011

Uma boa notícia: Câmara Municipal de Ponte de Lima cria "Casa de Montanha"



Só recentemente soube desta notícia e não posso deixar de lhe dar o destaque merecido. É uma iniciativa feliz e que poderia servir de exemplo para recuperar parte do património dos antigos Serviços Florestais. Naturalmente que nem todas as casas poderiam ser assim recuperadas, mas este é apenas um dos modelos possíveis e seria aplicável em muitas das casas abandonadas pelas serras. 

Câmara Municipal aprova “Casa de Montanha – Centro de Acolhimento e Núcleo Patrimonial – Cerquido” - Reunião de Câmara de 14 de Novembro
 
A Câmara Municipal de Ponte de Lima em reunião, realizada no dia 14 de Novembro, aprovou a abertura de procedimento concursal, mediante Concurso Público da empreitada de "Casa de Montanha - Centro de Acolhimento e núcleo Patrimonial - Cerquido".

O projecto consiste no restauro de uma casa agrícola serrana, adquirida pelo Município de Ponte de Lima, conferindo-lhe uma nova função, de índole sociocultural, através da sua reconversão numa instalação polivalente, aberta à comunidade e aos visitantes.

Ao implementar este projecto, o Município de Ponte de Lima pretende definir uma estratégia de divulgação do património material e imaterial. Considerando os valores patrimoniais existentes no núcleo do Cerquido, o referido projecto inclui as seguintes áreas funcionais: - espaço de acolhimento, intitulado "Sala dos Amigos da Casa"; espaço "Eventos e Momentos", consistindo num micro-auditório polivalente; cozinha de apoio à realização de mostras e workshops gastronómicos; "Sala de Aprendizagem", concebida enquanto espaço para a dinamização de acções formativas especializadas, especialmente no domínio do artesanato; oficina "Artes à Moda da Serra", destinada à demonstração de artes e ofícios e exposição de artesanato; espaço expositivo para o acolhimento de exposições permanentes e itinerantes.

Este equipamento multifuncional será o ponto de partida ou chegada de uma rede de itinerários culturais, suportada por painéis informativos e uma mesa interpretativa, expandindo no espaço envolvente o conceito e a função do Centro de Interpretação.

Assim, o turista será guiado no seu percurso de descoberta do território quer através de suportes representativos, textuais, gráficos ou multimédia, quer através da observação directa e da vivência sensorial do espaço físico.




Wednesday, November 30, 2011

Sobre as Cabras Selvagens


Seguindo uma indicação do Rui Barbosa acabei a leitura de "A Cabra-Montês do Gerês - Da extinção à reintrodução, Um novo desafio", da autoria de Miguel Dantas da Gama e editado pelo FAPAS. O livro é uma actualização de uma anterior publicação do mesmo autor e, além dos testemunhos históricos da antiga presença da cabra-montês, regista com detalhe os primeiros passos do seu regresso e debate as questões que condicionam o futuro desta nova população.

No entanto a expressão “reintrodução” faz presumir uma acção objectiva e deliberada que não existiu e não reflecte bem o acaso deste regresso. “Chassez le naturel, il revient au galop” recordou-nos o Miguel Torga a 6 de Agosto de 1948 e a história deste regresso parece confirmar que a natureza possui uma vontade instintiva que não é fácil controlar.

Em completemento a leitura do livro recomendo a leitura do seguinte estudo.

Tuesday, October 25, 2011

A VEZEIRA DA RIBEIRA

Recentemente encontrei um artigo publicado na revista GeoPlanUM, publicada pela Associação dos Estudantes de Geografia e Planeamento da Universidade do Minho. O artigo trata a vezeira da Ribeira, uma das vezeiras em actividade na Serra do Gerês e deu-me oportunidade de pensar sobre a razão histórica da sua existência. Sabia desta vezeira e já me tinha interrogado sobre as suas razões considerando as suas particularidades actuais. Uma curiosidade que nunca tinha ido muito longe, mas que este artigo despertou.

Sobre o artigo publico-o como o li, sem fazer qualquer comentário para além desta pequena introdução. Os que conhecem a serra sabem que parte do território indicado como pertencente à vezeira da Ribeira é hoje tido como da vezeira de Fafião. Uma disputa antiga entre as vezeiras que tanto julgo saber terá tido origem numa alteração da demarcação dos territórios administrativos, uma vez só modernamente o Rio Fafião passou a demarcar os limites de Fafião. Uma questão que julgo estar actualmente encerrada por acordo entre as partes e que procurarei esclarecer numa outra oportunidade.

Verifica-se, mais uma vez, que determinados locais mudam a sua designação de acordo com as fontes. O curral de Entre Águas parece corresponder ao Poço Verde e o aqui referido como curral do Conho, diferente do outro mais a norte e mais conhecido, recebe o nome da linha de água vizinha. Fico ainda com algumas dúvidas se o Curral do Cando, não referido, não será utilizado também por esta vezeira. Embora só conheça um acesso a este curral por cotas mais elevadas seguindo a cumeda da Corga das Giesteiras. Os currais referidos acabam por ser a quotas substancialmente mais baixas dos das outras vezeiras.

O artigo não esclarece as razões da existência de uma vezeira no concelho de Vieira do Minho na Serra do Gerês e eu julgo ter uma explicação. Hoje pode parecer estranho  que a vezeira atravesse a albufeira de Caniçada numa barcaça (julgo que cedida pela EDP como compensação) e suba à serra  para aproveitar os pastos de altitude  no concelho de Terras de Bouro, mas sem sempre isso foi assim. Se sobre a albufeira o artigo deixa claro que é uma barreira moderna, pelo que antes o gado passava o rio Cávado sem problemas, não explica os direitos históricos da vezeira da Ribeira na Serra do Gerês.

Eu atrevo-me a avançar com uma hipótese. Uma hipótese contida na designação da vezeira. É que as freguesias que hoje integram a a vezeira pertenceram a um antigo concelho chamado Ribeira do Soaz. Um concelho de que também fazia parte a freguesia de Vilar da Veiga. Ora, Ermida é hoje um lugar de Vilar da Veiga e já o era então. Pelo que julgo ser esta a justificação dos direitos históricos da vezeira da Ribeira. A extinção do concelho da Ribeira do Soaz não extinguiu os direitos de pastagens e o gado contiuou a subir à serra sem olhar aos limites administrativos. Tal como os direitos de Fafião se mantiveram no concelho de Terras de Bouro.












A VEZEIRA DA RIBEIRA*
Américo Castro, André Lima, José Salgado e Pedro Pereira**

Resumo

A pastorícia constitui, nas áreas de montanha, uma prática secular e a Vezeira da Ribeira não é uma excepção à regra, pois realiza-se há mais de dois séculos na região do Parque Natural da Peneda-Gerês. Estas tradições rurais tendem a desaparecer, quer devido ao abandono das áreas rurais por parte das populações mais jovens, quer pelo facto de a criação de gado em regime livre ser um negócio cada vez menos lucrativo. Apenas sobrevivem graças ao esforço de algumas pessoas que se sentem realizadas pelo facto de continuarem a fazer com que o costume não seja ultrapassado nem esquecido lutando para manter um hábito que muitos teimam em ver extinto.

A Vezeira da Ribeira viu-se envolvida, nos últimos anos, numa “batalha” que a opôs à direcção do Parque Nacional Peneda-Gerês. Este passou a integrar a rede europeia PAN-Parks, e para tal necessitava de cumprir um conjunto de requisitos obrigatórios, nomeadamente possuir uma área virgem de 10.000 hectares completamente desprovida de acção humana. A única área possível era a ocupada por esta e outras Vezeiras da região.

Neste artigo pretendemos expor alguns conceitos necessários à compreensão desta temática, bem como apresentar a Vezeira da Ribeira, o seu percurso e as suas principais problemáticas.

* Artigo baseado no trabalho “A Vezeira da Ribeira” realizado na Unidade Curricular de Geografia Física de Portugal II e orientado pelo Doutor Bento Gonçalves
** Alunos do 3º Ano de Geografia da Universidade do Minho no ano lectivo de 2008/09

1. Pastoreio em Áreas de Montanha

Desde os tempos mais remotos que as populações das áreas rurais dependem dos recursos que o solo lhes dá. O Homem foi-se adaptando e ultrapassando as dificuldades apresentadas pelo relevo, recorrendo a diversas técnicas e sempre a um grande espírito de entre-ajuda e cooperação. Desta forma, conseguiu elaborar estratégias para a resolução dos seus problemas agrícolas e de pastoreio. Este equilíbrio foi alcançado com base na sustentabilidade e conservação dos sistemas produtivos que compunham todo o território serrano.

As aldeias destas áreas têm uma forte ligação com a montanha e, ao longo dos séculos, os seus habitantes foram aprendendo a tirar proveito desta localização. Assim sendo, a principal actividade das aldeias serranas, na maioria dos casos única, assentava numa agricultura de subsistência baseada na produção animal em regime extensivo e em práticas comunitárias muito fortes. Desta forma, a complementaridade entre as áreas agrícolas e as áreas serranas são fundamentais para a produtividade dos sistemas agrários e para a sobrevivência da população. A criação de gado dependia, fundamentalmente, da produtividade das pastagens serranas, visto que o alimento disponível para o gado nas áreas agrícolas era, na maioria dos casos, insuficiente para a sua alimentação ao longo do ano.

As pastagens serranas são compostas sobretudo por áreas de matos e prados naturais ou semi-naturais de montanha e ainda de sub-bosques. As que estão localizadas a menor altitude suportavam o gado na maior parte do ano, sendo que de Maio a meados de Outubro o gado permanecia na serra sob vigilância de pastores.

Geralmente estes permaneciam no interior das brandas, que são a implantação de núcleos habitacionais localizados no cimo da serra para onde as populações se deslocavam no Verão levando consigo os seus animais para pastarem durante toda a época estival, realizando, também, algumas tarefas agrícolas adaptadas à altitude e ao clima aí existente nessa época do ano. No restante período do ano para contornar os Invernos rigorosos as populações desciam com o gado para núcleos habitacionais situados nos vales, local onde passavam toda a época fria. Esta prática é designada de Inverneiras.

Um outro tipo de movimento do gado em área serrana é a chamada Vezeira, que consiste numa prática comunitária de pastoreio do gado, em que cada pastor guarda “à vez” o rebanho de toda a aldeia. De acordo com o número de cabeças de gado pertencente a cada agricultor, são-lhe atribuídos dias de vigilância ao rebanho comunitário. Terminados esses dias a tarefa transita para outro pastor e assim sucessivamente até que todos os pastores pertencentes à Vezeira cumpram a sua obrigação de guardar a manada.

2. As Vezeiras

Desde tempos remotos, e ainda na actualidade, a posse de terra e de gado servia de base para a diferenciação social, assim, possuir uma junta de vacas era um símbolo de riqueza. Considerava-se que quem possuísse vacas tinha que ter, obrigatoriamente, recursos para as sustentar. Assim sendo, teria de ser proprietário de um considerável património, que garantisse a pastagem e a produção de feno suficiente para alimentar o gado durante o Inverno. Neste sentido, e tendo em conta que nem todos conseguiam ter gado, as comunidades viam-se obrigadas a rentabilizar ao máximo os recursos disponíveis e a criar estratégias de cooperação para aceder aos recursos essenciais, com custos mínimos, de modo a tornar sustentável a posse de gado mesmo por aqueles que tinham poucos recursos.

Em regiões onde existiam imensos constrangimentos, nomeadamente características físicas do terreno adversas e condições sócio-económicas débeis, as populações locais tiveram a necessidade de responder a estas adversidades de modo a minimizar os seus esforços e a rentabilizar a sua actividade. Para tal, entre outras acções, organizou o pastoreio de acordo com: o tipo de animais, a natureza dos pastos, e as condições específicas de cada comunidade. Estas, embora sejam diferentes nos diversos locais, correspondem a uma diversidade de esquemas de vigilância, que por sua vez correspondem a um modo de vida que é o silvo pastoril comum.

Foi neste âmbito, que apareceram diversas estratégias tais como o “Boi do Povo” e a vezeira. A primeira, o Boi do Povo, consistia na associação dos vários lavradores de uma aldeia para a compra, manutenção e sustento de um ou mais touros reprodutores. A quantidade destes animais dependia do número de vacas existente na povoação. Deste modo, aqueles eram propriedade comum dos diversos lavradores e tinham como principal função a reprodução. Por norma, a manutenção do Boi estava a cargo do conjunto de lavradores, utilizando, entre eles, um sistema de rotatividade, em que cada um ficava com o animal por um período de tempo proporcional à quantidade de vacas que possuía.

A segunda estratégia, a vezeira, é uma velha prática comunitária de pastoreio em que num só rebanho, ou manada, se juntam as cabeças de gado de 10, 15, 20 ou mais proprietários (Santos Júnior, 1980:422). Estas manadas comuns eram levadas para as pastagens pelos diversos proprietários, num sistema rotativo sempre de acordo com o número de cabeças que cada um possuía. Assim sendo, o número de dias atribuídos a cada proprietário variava de aldeia para aldeia, dependendo, principalmente, do tamanho e da quantidade de manadas existentes. Deste modo, poderia ser estabelecido que cada proprietário teria de efectuar um dia de vezeira, por cada cabeça de gado, ou então, um dia por cada cinco ou dez animais. Estas Vezeiras podiam ser permanentes, ou seja efectuadas diariamente durante todo o ano, ou então, serem sazonais, isto é, realizadas durante um determinado período do ano, que poderia corresponder a determinada estação do ano ou a épocas de maior trabalho.

Este método de pastoreio está a desaparecer aos poucos. Esta situação deve-se, fundamentalmente, à desertificação populacional destas áreas, provocada pelo aumento da emigração e imigração, bem como à florestação de extensas áreas de baldios que tem levado a uma redução drástica das áreas de pastagem. De forma a preservar o crescimento das árvores, passou a ser proibida a pastorícia, principalmente de cabras, nas áreas florestadas.

Situações como estas têm vindo a fomentar a venda dos animais, tornando progressivamente inviável a realização de vezeiras.

3. A Vezeira da Ribeira

As freguesias da Vezeira da Ribeira pertencem a Vieira do Minho, no entanto, as suas pastagens encontram-se já no concelho vizinho, ou seja, em Terras de Bouro. Esta, em outros tempos, permitia o atravessamento do rio Cávado por parte de centenas de cabeças de gado, este número, na actualidade, reduziu para dezenas de unidades. Vieira do Minho é um concelho do Norte de Portugal, em termos administrativos este insere-se na NUT II – Norte, mais concretamente na NUT III – Ave. Este concelho é constituído por vinte e uma freguesias, sendo que, a Vezeira em estudo, serve as freguesias de Louredo, Ventosa e São João da Cova.

Como já foi referido, este concelho situa-se na proximidade da serra do Gerês, o que faz com que em termos físicos, herde bastantes características deste maciço. É, deste modo, um concelho que ainda apresenta algum relevo granítico.

Trata-se de um concelho bastante rural, que apresenta uma população muito tradicional e algo dependente da agricultura. Em tempos, a agricultura constituía fonte de rendimento e era indispensável para a sobrevivência destas populações. Assim, as actividades agro-pastoris eram parte integrante do dia-a-dia das populações locais. Deste modo, grande parte das famílias destas freguesias viviam dependendo da terra e do gado, que constituía, em simultâneo, fonte de riqueza e de alimento. Estes estabelecem os dois pilares que garantem a reprodução socio-económica da população local (Taborda, 1932:131). Assim, a criação de gado assumiu um papel preponderante nas regiões de montanha, terras onde as condições extremas, nomeadamente, o rigor do clima e os solos muito fracos tornaram difícil a vida da população. Neste sentido, podemos dizer que, desde tempos remotos, a agricultura tem andado de mãos dadas com a pastorícia.

Será, ainda, pertinente referir que nesta área predomina o gado bovino, nomeadamente de raça Barrosã, no entanto, também se verifica a presença de algumas espécies caprinas e, muito raramente, ovinos Bordaleira. Uma outra espécie que se tornara uma importante fonte de rendimentos para os agricultores locais é o Garrano (equinos). Este encontra-se no Gerês, no entanto, já fora da área em estudo. Estes animais são muito importantes, quer pelo seu desempenho em trabalhos agrícolas, pela adubação e fertilização dos solos, quer enquanto produtores de carne para consumo próprio ou para venda. Como é evidente, um factor muito importante para a criação destas espécies é a existência de pastos naturais muito ricos, denominados de lameiros.

A Vezeira da Ribeira pode ser observada no concelho de Vieira do Minho, e em tempos, servia a população de cinco freguesias, no entanto, e como já foi referido anteriormente, actualmente limita-se às freguesias de Louredo, Ventosa e São João da Cova. Estas são freguesias ribeirinhas do rio Cávado, encontrando-se, todas elas, na margem esquerda do mesmo. Têm uma densidade populacional muito baixa (Louredo, Cova e Ventosa com respectivamente 0,63; 0,76 e 0,94 hab/ha), tal como as restantes freguesias do Concelho de Vieira do Minho, que varia dos 0,17 (Campos) aos 3,18 (Vieira do Minho) hab/ha.

Neste caso concreto, a vezeira consiste na travessia e subida do gado para a Serra do Gerês. Esta é uma tradição que integra a vida comunitária da região há mais de duzentos anos. Esta vezeira consiste na passagem do gado pela barragem da Caniçada, através de uma barcaça, saindo da freguesia de Louredo, do concelho de Vieira do Minho, para o lugar da Ermida no concelho de Terras de Bouro. Depois da travessia da albufeira, o gado sobe para a Serra do Gerês onde vai pastar durante os três meses seguintes.

A Vezeira da Ribeira e outras existentes no Parque Nacional da Peneda-Gerês, encontram-se envoltas numa problemática, pois os responsáveis pelo parque pretendem acabar com tudo o que seja brandas e vezeiras, isto porque pretende aderir à rede PAN-Parks, uma rede que junta os principais parques naturais europeus. Para alcançar este objectivo aquele parque tem de possuir no mínimo 10.000 ha de área sem qualquer intervenção humana, ou seja, uma área completamente virgem em que não se verifique qualquer actividade humana. Nesta questão reside a maior preocupação, pois dentro desta área de protecção total existem terrenos comunitários que pertencem aos baldios e às vezeiras de gado.

Pelo exposto, podemos dizer que esta problemática se apresenta como um pau de dois bicos. Pois, se por um lado se pode perder a oportunidade de aderir a uma rede europeia que Ao longo do percurso desta vezeira existem pequenas “cabanas”, apelidadas de Fornos, que estão disponíveis para os vezeiros pernoitarem enquanto acompanham o gado na subida. Podem integrar esta vezeira homens ou mulheres com idade superior a dezasseis anos.

Figura 1 – Enquadramento Geográfico da área em estudo.

Fonte: Worldwide shaded relief by ESRI using GTOPO30, SRTM, and NED elevation data from the USGS

As vezeiras nas últimas décadas têm sido bastante afectadas com o êxodo rural, as populações em busca de melhores condições de vida têm sido forçadas a abandonar estas freguesias mais remotas. A indústria é praticamente inexistente nestes locais e a agricultura apenas é utilizada na sua vertente de subsistência. Os poucos habitantes que continuam a viver nesta zona têm os seus empregos nas cidades mais próximas, Braga, Póvoa de Lanhoso e Vieira do Minho e por isso encaram a agricultura como uma segunda actividade. Para além de serem menos os habitantes, os actuais proprietários de gado possuem menos cabeças que noutras décadas, dada a dificuldade que existe em tratar dos animais.

Actualmente a Vezeiras da Ribeira conta com 16 sócios proprietários e um total de 23 cabeças de bovinos, na sua maioria de raça Barrosã e Galega. Em Junho e em Setembro, desde há longos anos, acontece o ritual da vezeira, o gado é então transportado de canoa (Barcaça) para a outra margem da barragem (a barragem foi construída em meados do séc. XX, antes disso o gado atravessava o rio a pé ou a nado) e de seguida é levado até ao topo da montanha onde vai passar três meses no pastoreio. Neste período estival, os proprietários, cada um pela sua vez, terão de vigiar o gado e garantir a sua segurança e pasto.

Nas zonas mais elevadas encontram-se alguns prados que conservam o alimento durante o período de maior calor e seca, graças à riqueza do seu solo e abundância de água. Na sua passagem e estadia pela Serra o gado alimenta-se, essencialmente, de fenos e ervas dos prados, assim como, matos como a urze que se encontram entre as rochas das encostas. Os prados, para além do alimento, disponibilizam as poucas sombras para os dias mais quentes e abrigos nas noites mais frias, assim como a água. Depois da passagem para as zonas altas da Serra do Gerês, os bovinos de diferentes proprietários pastam, em conjunto, entre Junho e Setembro, altura em que descem novamente as montanhas e regressam ao concelho de Vieira do Minho.

A Vezeira da Ribeira é regida por normas que ditam direitos e obrigações dos sócios, esta é chefiada por um Juiz, na actualidade pelo Sr. António Campos, cujo cargo é renovado anualmente através de eleições que são realizadas no dia do chamado. Como nos foi explicado pelo Juiz, (…) em tempos, era tudo muito mais rígido e seguido. Hoje em dia o cargo de Juiz já não é tanto uma honra, mas mais um encargo de grandes responsabilidades e que não dá qualquer lucro (…).

Todos os anos, há dois “chamados”, um antes da subida da vezeira, no penúltimo domingo de Maio, e a outra antes da descida da vezeira, no penúltimo domingo de Agosto. Nesse momento todos os sócios devem estar presentes, pelas 14 horas no lugar de Costarela (local de chamada), ou fazer-se representar por uma pessoa maior de idade. Como já foi referido, embora já tivessem tido um maior número, actualmente, esta sociedade tem cerca de 16 sócios que pagam uma cota de 25€ por ano. O “chamado”, que se realiza junto a um carvalho monumental, ainda se efectua como antigamente. Neste “chamado” ainda existe a tradição oral, ou seja, as questões são resolvidas na base da palavra, que funciona como uma espécie de escritura. É neste encontro que, entre outras coisas, se realiza a eleição de um novo Juiz e de dois Vogais.

Esta sociedade pode levar o gado, para a Serra do Gerês, a partir de 1 de Junho a 8 de Setembro. Cada sócio é livre de levar as cabeças de gado que quiser, no entanto, estas são previamente examinados para ver se estão bem de saúde e não têm qualquer tipo de doença com que possam contagiar outros animais, ou impossibilite o seu desempenho neste período de pasto livre.

Como já foi referido o pastor da vezeira assume o cargo de forma rotativa, tendo de ser avisado com uma antecedência de três dias para ir guardar a vezeira. Uma vez ao serviço não pode abandonar o gado sem justa causa. Este deve pernoitar junto do local onde está o gado, pois caso falte algum bovino será da sua inteira responsabilidade. Se por ventura algum animal adoeça, o pastor tem o dever de avisar o juiz, pois fica ao encargo da sociedade as despesas de transporte, veterinário e medicamentos.

Devido ao desconhecimento, por parte de autarquias e entidades, da existência da vezeira, esta não tem qualquer tipo de ajuda por parte de alguma delas. Assim, já há anos que se tenta angariar fundos para o restauro dos Fornos, de modo a permitir melhores condições de pernoita, potenciando, de certa forma, este acto como uma possível rota turística. No entanto, existe um entrave ao turismo que é o facto de alguns destes Fornos estarem em áreas protegidas.

Todos os anos a vezeira parte com grandes festejos e juntam grandes multidões que se deslocam aquele local para assistir a uma tradição que já é rara e está cada vez mais em perigo de extinção. No dia da subida da vezeira há convívio entre a população em geral, que sobe juntamente com aquela, levando couves, feijões e carne, essencialmente de porco, para confeccionar o típico prato desta vezeira “Feijões com couves”.

Foto 1: Barcaça da Vezeira da Ribeira

Após a partida, a Vezeira da Ribeira terá pastagens em comum com outras vezeiras, no entanto, duas vezeiras nunca podem estar no mesmo lugar e ao mesmo tempo. Em tempos idos, antes da construção da Barragem da Caniçada, os animais conseguiam atravessar o rio a pé ou a nado. Com a sua construção, em meados do Século XX, para realizar esta passagem, foi disponibilizada uma Barcaça que leva entre 8 e 10 cabeças de gado. Actualmente, com o número de espécimes que a vezeira possui, não é necessário realizar-se mais do que duas travessias.

A vezeira parte cerca das 7 horas da freguesia de Louredo para o lugar da Ermida em Terras do Bouro, acompanhada dos seus proprietários.

Geralmente, entre as cabeças de gado, apenas sobe um boi reprodutor, qualquer outro macho que acompanhe a manada é castrado, deste modo evitam-se conflitos entre eles. É de salientar que este é então o chamado “Boi do Povo”, que quando a vezeira se encontra nos baixos pastos, nos estábulos dos respectivos donos, vai circulando de forma rotativa por cada casa. O número de dias que permanece em cada proprietário é proporcional ao número de vacas que cada um possui.

Esta tradição permanece viva muito graças à vontade e empenho dos donos dos animais, que continuam a fazer valer o direito ancestral do uso das zonas de pasto na serra. Ao mesmo tempo, é a prova que estas localidades ainda mantêm em uso algumas das actividades do sector primário, actividades que são forte expressão da ruralidade e tipicidade desta região minhota.

4. Percurso da Vezeira da Ribeira

O percurso que é realizado pelos pastores e respectivo gado, quando efectuam a subida da vezeira, como é evidente, é realizado em várias etapas, nas quais os pastores vão deixando o gado nas diferentes pastagens do percurso, denominadas de Currais. Quando o pasto deixa de ter alimento, o pastor desloca consecutivamente a manada para a pastagem seguinte durante toda a época estival, até que, no fim desta, voltam a descer o gado dos pastos em altitude para permanecerem durante o Inverno nos pastos mais baixos, junto às aldeias. Como já foi referido, actualmente, nesta vezeira cada pastor guarda a manada por um número de dias correspondente ao dobro do número de cabeças de gado que possui. Quando termina o seu período de guarda, este entrega a manada ao pastor seguinte, no curral correspondente à sua posição. Neste momento o pastor tem de, obrigatoriamente, ter reunido todas as cabeças de gado no respectivo curral para que se realize, na presença dos dois pastores, a contagem dos animais. A referida troca de pastor, é sempre realizada ao pôr-do-sol. Ao passar o testemunho, o novo pastor encarregue pelo gado conta-o, verifica-o e, consequentemente, torna-se responsável por ele até à próxima troca.

Nesta vezeira encontramos, essencialmente, gado bovinos da raça Barrosã, e embora em menor proporção, bovinos da raça Minhota ou Galega, verifica-se ainda a existência de alguns caprinos.

Nas últimas décadas, o número de cabeças de gado desta vezeira tem vindo a diminuir drasticamente, passando de números da ordem das centenas para, na actualidade, possuir apenas duas dezenas. No que diz respeito à alimentação do gado, este ingere essencialmente erva, no entanto, quando esta escasseia, alimenta-se também de Urzes. Não obstante este facto, e ao contrário das cabras e das ovelhas, as vacas são mais selectivas no que diz respeito à alimentação determinando e limitando assim a escolha dos pastos.

A Vezeira da Ribeira estende-se numa área de cerca de 1100 hectares e cujo perímetro é de, aproximadamente, 12 km. Actualmente, 23 cabeças de gado compõe esta vezeira, sendo que, no decorrente ano, subiram, numa fase inicial, 21, e posteriormente juntaram-se-lhes mais duas. No entanto, segundo o juiz António Campos, a dimensão da manada subiu este ano em comparação com o ano anterior. No entanto nada que se compare com o passado em que o número era muito superior. Este ano a Vezeira da Ribeira aumentou o seu número de sócios, tendo actualmente um total de dezasseis associados.

Antes de apresentarmos o percurso desta vezeira consideramos pertinente a exposição de determinados conceitos relativos a esta temática e que podem ajudar na compreensão da mesma.

Assim, podemos dizer que um Forno é um abrigo, muitas vezes rudimentar, que permite a pernoita do pastor no local, junto ao curral.

Foto 2: Forno da Giesteira
Foto 3: Interior do Forno da Giesteira

Um Curral é uma área de pasto, mais ou menos plana, que permite o agrupamento da manada.

Foto 4: Curral da Giesteira


Uma mariola é um pequeno amontoado de pedras sobrepostas, que têm por finalidade sinalizar o caminho pelo meio da serra, assim, nos dias de nevoeiro os pastores guiam-se por estas de modo a não se perderem, na imagem que se segue podemos observar uma destas mariolas.

Relativamente ao percurso, antigamente os primeiros pontos de paragem eram na Ermida, no entanto, devido ao menor uso e número reduzido de cabeças de gado que a vezeira apresenta actualmente, estes já não são utilizados. Assim sendo, o primeiro ponto a ser utilizado presentemente é a Giesteira, que se encontra um pouco acima da cascata do Arado. Assim, verifica-se que na actualidade determinados pontos, ou por terem menor interesse, ou por serem de mais difícil ou perigoso acesso, são abandonados em detrimento de outros que, pelos motivos anteriormente referidos, vão sendo suficientes para as necessidades actuais.

Não esquecendo o declínio que esta prática vive actualmente, é de destacar, a existência de pastores que passam a noite em altitude com o rebanho. Acto, cada vez mais digno de respeito, quando se tem em consideração que as condições de albergue não são as melhores, pois actualmente a maioria dos Fornos onde os pastores pernoitam apresentam-se num estado degradado, em certos casos infiltram água. Facto que se deve, essencialmente, a uma inexistente manutenção dos mesmos nos últimos tempos.

Foto5: Mariola

Podemos, ainda, referir que se verifica a existência de dois tipos de Currais, os principais em que se observa sempre a presença de um pequeno abrigo, denominado de Forno, para o pastor passar a noite e de um ponto de água. As restantes são apenas locais de pastagem, em que o pastor deixa o gado e vai passar a noite no forno mais próximo do curral.

Consideramos que é notória uma certa rivalidade entre determinadas vezeiras, no sentido que, foram notadas diversas atitudes, por parte dos seus protagonistas, que denunciavam aquilo que poderíamos considerar um certo bairrismo. A título de exemplo, observamos em determinados locais gravações que ostentavam o nome da vezeira junto aos abrigos, e quando tal acontecia estavam sempre gravados ambos os nomes, como se defendessem a posse do local.

Segundo o Sr. António Campos, actual Juiz da vezeira, a Vezeira da Ribeira é mais antiga do que a vizinha Vezeira da Ermida e por isso, sempre que estas tenham pastos comuns, à chegada da Vezeira da Ribeira a Vezeira da Ermida tem de abandonar o local, prevalecendo, assim, um princípio de antiguidade.

No que diz respeito às diferentes paragens, este percurso divide-se em vários currais, cada um deles possui um forno, ou seja, um espaço com mais ou menos condições que permite aos pastores pernoitarem nos altos pastos, e um ponto de água. Este percurso serve as freguesias anteriormente referidas e inicia a sua subida para os altos pastos num local, a que chamamos de Barcaça, pelo facto de se efectuar a travessia do rio numa barcaça, cedida pela EDP quando se efectuou a construção da barragem, como já foi referido nos capítulos anteriores.

Na Figura 2 podemos observar os diferentes percursos existentes, a linha amarela representa o trajecto aproximado entre a Barcaça e o início dos percurso de altitude. Representamos esta parte do percurso de cor diferente porque não foi realizada pelo grupo. A vermelho temos os percursos de altitude que foram registados através de marcação GPS. Podemos, deste modo, ter uma percepção das distâncias percorridas pelos pastores e pelas suas manadas, deslocamento que é realizado a pé por zonas que, em certos casos, oferecem precárias condições de progressão.

Assim, como é possível observar, o gado pertence as freguesias da margem Sul do rio. No dia da subida os diferentes proprietários reúnem-se junto à Barcaça para a travessia do rio. De seguida inicia-se a ascensão para os pastos de altitude, numa caminhada de cerca de quatro horas até chegar a uma zona central, denominado de Tribela, em que os percursos se dividem. A partir deste ponto existe varias opções possíveis, que podemos apresentar em três percursos alternativos. Um primeiro que junta os pastos da Tribela à Giesteira e Malhadoura. Um segundo que parte da Tribela para Pinhô, seguindo para Entre Águas e Conho. Por último, um terceiro que parte na mesma de Pinhô, mas desta vez em direcção a Pousada e Bicos Altos. Existem ainda mais dois pequenos percursos que ligam a Tribela ao pasto da Corriscada e outro à pastagem de Viseu. Em tempos passados, em que as manadas eram de maiores dimensões, os pastos faziam-se poucos e, por isso, os pastores eram obrigados a percorrer a totalidade dos percursos durante a época estival. Actualmente, tendo em conta o número reduzido de cabeças de gado que formam as manadas estes percursos são usados de forma alternada de ano para ano.

Na Figura 3 podemos observar os diferentes percursos e os diferentes currais anteriormente referidos. É possível também verificar uma orientação generalizada para Norte em direcção às cotas mais elevadas e uma progressão dos percursos da Vezeira da Ribeira ao longo dos vales de altitude que apresentam entre si um certo paralelismo, talvez devido à existência de fracturas presentes neste maciço granítico. A deslocação da Vezeira é sempre realizada num sentido ascendente e circundados pelos cimos deste Maciço.

Figura 2: Enquadramento e percurso da Vezeira

Figura 3: Localização dos Fornos e percursos de altitude
 
Notas conclusivas


Em termos de conclusão podemos dizer que a vezeira ou “pastoreio à vez” é uma forma de criação de gado, assente em fortes ligações comunitárias que persistem na região, rompendo o individualismo reinante nas sociedades de consumo cosmopolitas. Estas representam tradições agrícolas cuja dimensão cultural poderia ser comparada a outras práticas como por exemplo o Boi do Povo, as Inverneiras, as Brandas e outras. São práticas que estão a entrar em desuso quer pelo facto de se verificar nas últimas décadas uma grande desertificação populacional das áreas rurais levando, deste modo, à diminuição da mão de obra disponível e por isso ao abandono das práticas agrícolas. Também podemos referir como causa a falta de rentabilidade económica que está ligada à agricultura tradicional dos nossos dias. Assim, podemos dizer que estas práticas sobrevivem pela insistência de um punhado de Homens que lutam, com o seu arduo trabalho, pela sobrevivência destas práticas ancestrais que forjam o nosso passado e as nossas raízes e que são parte integrante de uma cultura típica das zonas serranas.

Este abandono conduz a uma outra problemática que se discute muito na actualidade e que se relaciona com o desenvolvimento de diversos problemas das nossas áreas montanhosas, nomeadamente, os incêndios florestais. Assim, podemos dizer que o abandono destas práticas leva também a uma redução da protecção e da vigilância natural, pois, as serras “habitadas” tinham uma vigilância permanente realizada pelos locais. Já sem referir a questão das limpezas das matas realizadas pelos gado durante a pastagem e, também, pelos pastores que as efectuavam para permitir uma mais fácil utilização dos espaços.

É evidente que estas problemáticas não afectam apenas a Vezeira da Ribeira mas sim todo tipo de práticas agrícolas similares. Consideramos que talvez fosse pertinente um maior apoio por parte das autarquias e até o seu aproveitamento para fins turísticos que poderia tornar rentável uma prática centenária que já há muito deixou de o ser.

Bibliografia
CARVALHO, E. (2006). Lima Internacional: Paisagens e Espaços de Fronteira, Vol. 1; Tese de Doutoramento em Geografia, Ramo de Geografia Humana. Universidade do Minho.
GONÇALVES, A. BENTO (2006). Geografia dos Incêndios em Espaços Silvestres de Montanha – Caso da Serra da Cabreira. Tese de Doutoramento em Geografia, Ramo de Geografia Física e Estudos Ambientais. Faculdades de Letras, Universidade de Coimbra.
MEDEIROS, A. C. (2000). Geografia de Portugal, Ambiente Natural e Ocupação Humana, Uma Introdução. (5.ª edição). Lisboa: Editorial Estampa.
VIEIRA, L. J., (2004). Raça Bovina Cachena, Associação de Criadores da Raça Cachena. II Jornadas Técnicas de Raças Bovinas Autóctones, 5 e 6 de Maio de 2004. Escola Superior Agrária – Castelo Branco
CASTRO et al (2009). A Vezeira da Ribeira. Departamento de Geografia. Universidade do Minho., Guimarães.
Gravações Áudio efectuadas pelo Grupo na entrevista com o Juiz da Vezeira.
Jornal de Noticias; 2 de Janeiro de 2009. Novo plano do Gerês restringe pastorícia.
Jornal de Noticias; 19 de Janeiro de 2009. Residentes recusam fim de pastagens e da caça.


Wednesday, October 19, 2011

Tesouro escondido em Vilarinho da Furna?





 No Domingo passsado pude caminhar pela parte da aldeia de Vilarinho da Furna a descoberto. Uma experiência estranha e repleta de emoções contraditórias até que uma pedra chamou a minha atenção num muro. Primeiro foi pela forma perfeitamente talhada, depois pelo que me pareciam ser vestígios de antigas inscrições. Não ficaria surpreendido se viessem a descobrir que aquela pedra é parte de um marco miliário, possivelmente retirado das milhas mais próximas da antiga aldeia ( as milhas XXIX ou XXX). Uma "descoberta" que acrescentou emoções à emoção de passear pelas antigas ruas de Vilarinho.

Aparentemente a comprovar as minhas suposiçoes encontrei em «Thesouro de Braga descuberto no Campo do Gerez» - um levantamento da Geira realizado em 1721 pelo Padre José Matos Ferreira e que, apesar parciaçmente trancrito em outras obras, só em 1982 seria publicado pela CMTB - um relato interessante .

 Escreveu Matos Ferreira sobre a milha XXIX: «...dizem os moradores da freguesia do Campo que hum do lugar de Vilarinho o fizera em pedaços e que delle fizera pesos de lagar e outras obras semelhantes, e que deste mesmo sitio e de outro fica adiante, levara dous padrões que tinha hua choupana, servindo-lhe de esteios...».









Friday, September 23, 2011

Sei um Ninho

















Sei um ninho.
E o ninho tem um ovo.
E o ovo, redondinho,
Tem lá dentro um passarinho
Novo.

Mas escusam de me atentar:
Nem o tiro, nem o ensino.
Quero ser um bom menino
E guardar
Este segredo comigo.
E ter depois um amigo
Que faça o pino
A voar...

Miguel Torga

Tuesday, August 30, 2011

Dois dias de Serra!



Já algum tempo que desisti de tentar descrever as paisagens por onde passo na serra. O mais importante é preservar as emoções que elas nos despertam e para o resto existem as máquinas fotográficas. Infelizmente, devido a uma traição tecnológica, dos dois dias de serra do último fim de semana poucas memórias fotográficas ficarão. Para já tenho apenas a foto que ilustra este post. Uma vista diferente do vale das Fichinhas.

O convite para esta caminhada veio de uma amiga que partilha da mesma paixão pelo PNPG. Na verdade, serei eu que partilho com a Dorita a mesma paixão. Poucas pessoas conhecerão tão bem a zona oriental do PNPG como ela. Os pastores e outros residentes foram-lhe transmitindo informações privilegiadas, pelo que caminhar com ela é sempre descobrir coisas novas. O pretexto era explorar Porta Ruivas - um local muito pouco visitado e normalmente identificado por Sombrosas - e serviria também para reencontrar o Fernando, um amigo que conheci, através dela, em condições que já descrevi aqui.

Com pena minha, os meus companheiros da “aventura” de Fevereiro não se puderam juntar destas vez, mas teriam gostado de estar presentes. Pela caminhada e para reencontrar o Fernando.

Esta caminhada serviu ainda para o Fernando iniciar a sua filha Verónica, de 12 anos, nestas coisas de montanha. Os avós viam sair a neta com alguma preocupação, mas podem ter orgulho na fibra que revelou e que deve vir do berço.

O grupo ficou constituído por mim, pela Dorita (White Angel), pelo Fernando, pela Verónica e pelo Leão – um pastor alemão belíssimo que já tinha acompanhado o Fernando em Fevereiro.

Se explorar Porta Ruivas era um dos atractivos da caminhada, o Fernando juntou-lhe outro ao propor irmos até ao local da dormida – lagoas do Marinho - por um trilho que há muito me despertava a curiosidade e que permitiu ainda conhecer os fojos de lobo de Pincães e de Alcântara.

Nas lagoas encontramos alguns residentes e naturais que estavam a passar o dia na serra e me fizeram pensar nas velhas polémicas entre o Parque e a população. Na sua maioria trabalham ou trabalharam fora da aldeia, mas aproveitam o Verão para voltar à "sua" serra. Esta apropriação não é apenas imaterial, porque, para além dos outros que são propriedade colectiva, alguns dos terrenos foram ou são das suas famílias. Se a serra já não é, como foi, a sustentação económica das populações é uma parte fundamental da sua identidade cultural. Um valor que o Parque precisa de considerar e valorizar como os outros valores que motivaram a sua criação. Conseguir o equilíbrio entre eles foi o desafio identificado no artigo publicado no número de Agosto da revista National Geografic, mais propriamente o desafio de preservar os valores ambientais respeitando as populações. Eu tenho sérias dúvidas que essa tenha sido a prioridade do PNPG nos últimos anos.

Ao jantar tivemos ainda a companhia de mais 3 companheiros de Vila do Conde com quem confraternizamos até o cansaço nos vencer. Há quem apenas goste de dormir em bons hotéis, mas, apesar da dureza do “colchão”, mas não me faltaram estrelas lá em cima. Faltou-me a minha  "Ariane"que ficou em casa a carregar o sonho.

Acordar na serra é uma sensação especial que todos deviam experimentar pelo menos uma vez na vida e depois do pequeno-almoço foi cheios de curiosidade que iniciámos a marcha. O destino era alcançar Porta Ruivas pelo norte.

Seguindo o caminho pelas minas do Borrageiro - em direcção ao que os pastores chamam serra dos bois - tomamos o trilho que nos levaria até aos Prados da Messe. No Curral dos Bezerros desviamo-nos em direcção a sul e encontramos um trilho perfeitamente definido. Foi sem grandes dificuldades que chegamos a um pequeno curral - que identificamos como curral de Porta Ruivas - onde algumas vacas a pastavam livremente. A partir deste curral continuamos a seguir as mariolas que, embora perfeitamente visíveis e em grande número, nos levaram por um trilho complicado e fechado. Um pouco mais à nossa esquerda era visível um outro trilho que acredito ser mais fácil de seguir. Um trilho que julgo ter início no estradão de acesso ao Porto da Lage . Depois de uma paragem para refrescar no Porto da Lage seguimos o trilho que nos levou até Fafião.

Nota 1
Desde a publicação do POPNPG que me impus alguma reserva na descrição das caminhadas e pode parecer estranho que a tenha quebrado. Particularmente quando assumo uma dormida na serra. Faço-o porque na minha interpretação a actividade está perfeitamente legitimada. O POPNPG estabelece que a pernoita na serra é dormir ao relento abrigado em bivaque ou pequena tenda, mas eu dormi dentro de uma construção em pedra e alvenaria. A caminhada, considerando o nº de  participantes, ainda que em ambiente natural, também não necessitavam de qualquer autorização prévia. 

Nota 2
Relativamente à partilha do track GPS aqui confesso que mantenho as minhas dúvidas. No entanto, considerando que todo percurso está marcado por mariolas, não vejo razões para não o fazer. Trata-se de um trilho de elevado grau de dificuldade física, mas espectacular. A decisão de o realizar deve ser muito bem ponderada avaliando as nossas condições e as condições exteriores. Condições climatéricas adversas podem tornar este trilho muito perigoso.




Thursday, July 28, 2011

QUERQUS BRAGA - Curso de Gestão de Recursos Florestais

O núcleo QUERQUS  de Braga  vai levar a cabo uma acção de formação sobre “Gestão de Recursos Florestais”, na Confraria do Bom Jesus, Braga, nos sábados, 19 e 26 de Novembro, das 9h00 às 12h30 e das 14h00 às 17h30. A taxa de inscrição é de 45€ para sócios e 56€ para não sócios. Mais informações através do telemóvel 927986133.



Texto de apresentação da formação

A Assembleia-Geral das Nações Unidas designou 2011 para o Ano Internacional das Florestas, com o tema “Celebrating Forests for People” ou “Florestas para Todos”, cujo objectivo é a promoção da conservação das florestas em todo o mundo, assim como a sensibilização da população para a importância do papel que as florestas desempenham no desenvolvimento sustentável global.

Em Portugal, a floresta, sofre de vários estrangulamentos, nomeadamente a reduzida dimensão da maioria das propriedades florestais e a ausência de uma gestão sustentável que tem como principais consequências o baixo rendimento dos proprietários, o aumento do risco de incêndios florestais e o uso da floresta de uma forma, e a um ritmo, que poderá comprometer as suas funções

A proposta que fazemos é de dar a conhecer um conjunto de acções, no sentido de valorização dos produtos retirados da floresta, considerando não só produtos tradicionais como a madeira, mas também outros menos contabilizados tais como o mel ou cogumelos.

Consideramos ainda algumas técnicas de minimização de risco de incêndio e prevenção e tratamento de pragas e doenças em espécies autóctones florestais.

Assim o Núcleo da Quercus de Braga vai levar a cabo uma acção de formação sobre “Gestão de Recursos Florestais”, na Confraria do Bom Jesus, Braga, nos sábados, 19 e 26 de Novembro, das 9h00 às 12h30 e das 14h00 às 17h30.

Objectivo: Dotar os participantes de conhecimentos que lhes permitam realizar uma gestão equilibrada e competitiva do ponto de vista ambiental, de produção e de multifuncionalidade sustentavél dos recursos florestais.

Programa:

1. A Floresta Portuguesa
2. Arboricultura
3. Apicultura
4. Oficina “Propagação florestal”
5. Minimização dos Riscos de Incêndios
6. Micologia
7. Prevenção e tratamento de pragas e doenças
8. Plantas Invasoras
9. Candidaturas PRODER

 
Inscrições


Em ficha própria a solicitar ao Núcleo de Braga da Quercus, Urbanização das Andorinhas, loja 7, 4700-359 BRAGA ou pelo correio electrónico braga@quercus.pt. A taxa de inscrição é de 45€ para sócios e 56€ para não sócios. Mais informações através do telemóvel 927986133.

Wednesday, July 27, 2011

Concurso de Fotografia sobre a Floresta Portuguesa “Floresta, a nossa herança global"


No âmbito do Ano Internacional das Florestas, a LPN e a Caixa Geral de Depósitos promovem um Concurso de Fotografia sobre a Floresta Portuguesa “Floresta, a nossa herança global”, que decorrerá entre 15 de Julho e 25 de Setembro de 2011.

O concurso de fotografia tem como objectivo sensibilizar o público para o património florestal de Portugal, incentivando cada um de nós a ter uma atitude mais sustentável e uma maior consciencialização ambiental para a preservação e conservação de todo o ecossistema florestal.

O desafio consiste em captar, através de uma fotografia, todo o magnetismo inerente à florestaA partir do dia 15 de Julho, e até 25 de Setembro, todos os interessados devem inserir as suas fotografias no site da Olhares - http://olhares.aeiou.pt/concurso/floresta-nossa-heranca-global/ e seguir as recomendações de participação. O júri elegerá a melhor foto em cada uma das 3 seguintes categorias: “Melhor Fotografia”, “Floresta Autóctone” e “Melhor Mensagem”. Cada vencedor receberá um conjunto de prémios.

Monday, July 25, 2011

O Curral Obsedo (Obecedo) - uma hipótese para outro topónimo e sua explicação

imagem do curral


Há na Serra do Gerês vários lugares fantásticos e um deles é um pequeno curral perdido num dos lugares mais inacessíveis da serra. Esse pequeno curral vale não só pela espectacularidade da sua localização, mas também como pelo percurso que é preciso fazer para o alcançar. É um daqueles lugares que parecem existir para nos recordar que não é só o destino que importa. A viagem deve ser sempre também parte do fascínio. Esse curral chama-se Curral do Obsedo, mas no final deste post perceberão que afinal se pode chamar outra coisa.
Há algum tempo atrás participei numa interessante busca do seu topónimo através do blogue Carris, de Rui Barbosa. Essa pequena busca pode ser consultada aqui. Na altura chegámos à conclusão que o curral se chamaria Obsedo (ainda que também apareça grafado como Obecedo). A fonte mais conclusiva foi um mapa, inserto no livro “Serra do Gerez: estudos, aspectos, paisagens” de Tude de Sousa (1909), que ilustra este post. Eu tinha encontrado duas ilustrações mais recentes em “Formas e depósitos glaciários e periglaciários da Serra do Geres-Xurés (Portugal; Galiza) Levantamento cartográfico” - Cuaderno Lab. Xeolóxico de Laxe. Coruña. 1992. Vol. 17, pp. 121-135, e em “Los Tills de la Serra de Geres-Xueres y la gaciacion pleistocena (Minho, Portugal - Orense, Galicia)” – Cuaternario e Geomorfologia, 4 (1990), pp 13-25, e depois confirmado em Tude de Sousa. As imagens podem ser encontradas aqui. O Rui Barbosa tinha recolhido a informação oralmente e depois confirmado em Tude de Sousa.
Um comentário de 17 de Junho no blogue Carris esclarecia que havia um erro na nossa leitura. Afinal no mapa devia-se ler “Absedo” e não “Obsedo”: «o nome inscrito no mapa do livro "Serra do Gerês" de 1909 de Tude de Sousa, do qual possuo um exemplar (sortudo),é na realidade "Curral do Absedo"».
O erro teria sido originado porque: «o ”A" maiúsculo parece um "O" maiúsculo, mas confrontando com outras palavras iniciadas com "A" maiúsculo, como "Curral de Albergaria" e com outra iniciada por "O" maiúsculo, como "Observatório", no canto inferior esquerdo do mapa, verifica-se que de facto o nome correcto é "Curral do Absedo"». Consultado o mapa, e feita a leitura comparada, a explicação parece correcta. Aceitando esta leitura, é possível que o mesmo erro tenha originado as designações usadas nas outras fontes que citei. Assim, o topónimo correcto seria Curral do Absedo.

Movido de curiosidade procurei verificar um possível significado de “absedo”. Num golpe de sorte encontrei num documento de Mirandés um significado possível. Absedo, sinónimo de abexedo, seria um local virado a norte ou sítio desabrigado. Dá-se o facto de o local poder ser assim considerado, pelo que esta pode ser uma hipótese para o significado do topónimo. Seria interessante perceber se existe algum fundamento para ela, mas por agora apenas funciona como uma provocação da curiosidade.

mapa de Tude de Sousa
leitura comparada dos topónimos

post script 1:

Em ARQUEOLOGIA - TOPONÍMIA RÚSTICA DO CONCELHO DE MACEDO DE CAVALEIROS encontrei uma outra possível justificação para o topónimo deste curral:

Abessada [36]- (ver abessedo)
Abessedo [22;29]- Gír., lado do monte não soalheiro; onde não bate o sol; de abessana, junta de bois esp. Para puxar o arado; o primeiro sulco que aberto, num campo arado, serve de referência para os demais.
Abexedo [21]- Corrup. de abessedo; (ver, abessedo)
Absedo [28;29]- Corrup. de abessedo ( ver, abessedo)

Se tivermos em consideração que a encosta oposta do vale do Homem se chama Encosta do Sol, por oposição, a encosta esquerda seria a encosta onde não bate o sol e poderia ser esta a origem de Absedo.

Monday, May 09, 2011

Plantação nos currais da vezeira (Fafião) - 4 de Junho


"Domingo, bem cedo, ao nascer do dia, passam 30 minutos das 6 da madrugada, os populares de Fafião reunem-se no centro da aldeia carregados de mochilas, instrumentos para remover a terra e duas dezenas de carvalhos.Sai-se da aldeia em grande algazarra com a carrinha apinhada de gente e numa estrada de terra batida lá se vai em direcção a Malhadoira. A estrada acaba, mas continua-se a pé, por entre nascentes, arvore-dos e regatos mansos, carregando instrumentos, árvores e boa disposição.

Chega-se a Pinhô, depois de mais de uma hora de caminho, passando por pastores, vacas, cabras, pássaros madrugadores e a neblina macia da matina. É hora de “matar o bicho”, descansar e organizar o trabalho para o dia. Entre copas de Gerupiga e pão da terra, decidem-se em assembleia as tarefas, a hora e o ponto de encontro. Formam-se grupos de 3 pessoas, divididos pelos vários currais onde serão plantadas as árvores. O mesmo é feito para a limpeza de carreiros, caminhos e matas, prevenindo os incêndios e conservando o património que muitos dias do ano se confunde com o seu lar.Pousada, Amarela, Vidoirinho, Iteiro D’ovos, Padrolã, Rocalva, são os nomes dados aos currais por onde passa a vezeira do gado. Localizados no coração da serra do Gerês, estes lugares contam histórias deste povo nativo, que desde o início da formação da aldeia percorreu as serras agrestes do Gerês, ora pelo calor abrasador do Verão, ora pelo frio e pela neve do inverno, semeando centeio, pastoreando vacas e cabras, trazendo contrabando da vizinha Galiza...Os currais são lugares situados em zonas planas, verdejantes e quase sempre com água; autênticos oásis no meio da montanha, com cabanas construidas em granito, onde os pastores pernoitam durante a época do pastoreio. As árvores são plantadas nesses lugares e à sua volta é construida uma pequena muralha com pedras, para que os animais não lhe comam as folhas. «Os antigos faziam o mesmo, e queremos manter a tradição, para que os nossos netos não esqueçam os seus antepassados e o seu modo de vida.»

No início da tarde ouvem-se os primeiros sinais por detrás dos cumes e vales amontoados de pedra e vegetação serrana. Regressam ao ponto de encontro os primeiros populares que entoam sinais sonoros, na linguagem da serra, bem entendida pelos pastores e viajantes daqueles lados.

Chegam cansados na hora do calor, depois do trabalho e da valente caminhada. É hora de acender a fogueira e fazer o almoço para que esteja pronto quando estiverem todos.É servido o almoço e em festa e convívio caloroso, descansa-se e conversa-se até à hora de regressar, já no final da tarde. Descendo a montanha até à malhadoira, na alegria e farra que caracteriza este povo serrano, encontram-se os vezeireiros, guardando pacificamente dezenas de vacas, próximos da cabana onde estão os mantimentos. Mais dois dedos de conversa e regressa-se à aldeia, à mesma hora que os rebanhos de cabras atravessam o rio.O exemplo destes populares mostra como é possível e inevitável a preservação da natureza, mantendo os costumes e tradições comunitárias, caracterizadas pela proximidade ao meio natural, gerindo o património e tomando decisões sem intermediários."

fonte: artigo retirado de um jornal local em 2005 ? (já não recordo o nome)

VII Subida da Vezeira - 15 de Maio

Friday, May 06, 2011

Sobre a vida pública e sobre as próximas eleições


“O descrédito da vida pública (mais lato que o descrédito da política e dos políticos) é o pior que pode acontecer a uma sociedade. É por essa razão que sempre desprezei o ataque sistemático e populista aos políticos. Não é com abstencionistas adeptos do mal dizer que vamos melhorar. Não me recordo de nada que tenha sido feito unicamente a dizer mal.” Escrevi isto há uns meses largos a um amigo e revolta-me a sua actualidade. As criticas aos políticos devem ser sempre feitas e sem poupar um. Não formam uma casta de intocáveis e alguns deles já deveriam estar cadeia. Precisam é de ser fundamentadas. Criticar de uma forma lata, sem critério e sem fundamentar é abrir as portas a todos aos “ismos” perigosos. Foi o descrédito da política que no século passado criou o caldo social para Salazar, Sidónio Pais e, ainda na monarquia, o João Franco aparecerem. Entre os políticos haverá muita gente fraca, alguns até desprezíveis, mas afinal a culpa é de quem? Quem os elegeu? A culpa é de ETs ou é nossa colectivamente? Os eleitores de Oeiras e Felgueiras quem são? São geneticamente diferentes de nós ou esses casos apenas demonstram pelo absurdo os nossos erros colectivos. Recordo que a crise mundial é de 2008, em 2009 estavam as economias mundiais a debater a crise. Em 2009 houve eleições em Portugal e aqui foi anunciada o fim da crise porque dava jeito. Em Portugal aumentaram-se salários quando outras economias os estavam a congelar porque isso dava votos. Em 2009 os que falaram contra isso eram derrotistas. Estamos em 2011, os que em 2009 e ganharam as eleições dizem agora que a culpa é da crise de 2008 - aquela que em 2009 já tinha acabado e permitiu aumentar os salários - e dos outros. Os outros, são os que em 2009 eram derrotistas e já diziam que isto acabaria por acontecer se não se alterasse o rumo.

Aos irresponsáveis dá jeito criar a ilusão que “são todos iguais”. O descrédito da política favorece os medíocres que querem estar na política e afasta os que deveriam estar na política. O ataque sistemático e populista à vida pública corrói as bases da sociedade. Como o senhor que bate na mulher, não paga impostos e frequenta as portas das escolas a seduzir criancinhas gosta de pensar que todos são como ele porque isso relaxa os critérios de avaliação dos seus comportamentos, há políticos que gostam de nos fazer acreditar que todos são iguais a eles. Só que não é verdade que seja assim. É a esses políticos que dá jeito que a abstenção seja elevada. São esses políticos que estão interessados no descrédito da vida pública.

A minha geração não se recorda, mas foi uma maciça participação nas primeiras eleições após a revolução de 1974 que cimentou a democracia. Foram os quase 90% de participação que nos salvaram da guerra civil como as memórias dos protagonistas de então começaram agora a revelar. É por isso que me irrita os apelos à abstenção e tudo mais que possa contribuir para ela. Os que acreditam que os partidos políticos estão errados devem agir para alterar isso.  Inscrevam-se no partido em cuja base programática acreditarem e promovam a mudança desde dentro. Ou então formem outros partidos que promovam a mudança. Não me venham é dizer que não vale a pena votar. Eu no dia 5 de Junho vou votar e não votarei em branco. Não credito que todos sejam iguais e não me deixo enganar pelas estratégias de comunicação que nos querem fazer acreditar que não é possível reflectir a nossa avaliação sobre os nossos governantes no próximo acto eleitoral.

Wednesday, April 27, 2011

A visitação, as autorizações e as taxas

Mais uma vez parece que a resolução de um problema que afecta de forma potencial centenas de praticantes de pedestrianismo, montanhismo ou «desportos» similares em Portugal terá de partir de pessoas em nome individual já que quem deveria defender os interesses de muitos, e principalmente dos seus associados, não foi capaz de o resolver «em tempo útil»!

Assim, cria-se uma plataforma de discussão na qual se pretendem definir propostas para resolver o verdadeiro imbróglio que foi criado pela aprovação do Plano de Ordenamento do Parque Nacional da Peneda-Gerês e da Portaria n.º 134-A/2010, de 4 de Março.

Chegados a este ponto, e sabendo não existir um consenso alargado dentro do próprio ICNB, IP quanto à aplicação (ou taxação) da portaria referida, torna-se urgente definir uma série de estratégias para que o Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG) e as outras áreas protegidas nacionais não se tornem zonas nas quais a visitação seja para muitos um acto de ilegalidade.

Foi decidido criar um grupo de discussão que terá a sua primeira reunião oficial a 7 de Maio pelas 15h00 na cidade de Braga em local a designar atempadamente.

Thursday, April 14, 2011

Revista Oxigénio -

Várias vezes me tinha interrogado sobre a razão das editoras não  apostarem numa revista sobre pedestrianismo/montanhismo. Os conteúdos não seriam problema e o público interessado neste segmento parece-me exisstir. No mercado editorial espanhol existem uma série de revistas interessantes e, a exemplo da Men's Health, apostar numa versão nacional  dessas revistas seria fácil.

Recentemente encontrei uma revista parece querer-se posicionar nesse segmento. Chama-se Oxigénio e prefere assumir-se como uma revista de outdoor, vida e desporto ao ar livre e será publicada trimestralmente com a SportLife. É um projecto editorial interessante e que estou certo abrirá um espaço. É mais um sinal que a da montanha e os seus desportos vai também ganhando relevância e dimensão enquanto actividade económica. Aliás citando uma entrevista a João Garcia na revista: "Com mais uma década virá uma tradição, depois a insdustria nacional ligada a equipamentos de montanhismo, mais umas personagens  deste desporto e o resto aparecerá por si só".

Tuesday, April 05, 2011

A corrida mais perigosa do mundo

Pelas 16:02, de 4 de Abril, ontem, Jorge Nascimento Rodrigues, publicava na edição online do jornal Expresso uma notícia com o título “Risco de bancarrota aproxima-se do irlandês”. No corpo da notícia explicava que a probabilidade de default da República Portuguesa tinha subido para mais de 40% e que os juros da dívida pública a 5 anos tinham-se aproximado dos 10%.

Pelas 16:02, novamente neste fatídico minuto, o mesmo jornalista, Jorge Nascimento Rodrigues, publicou, na mesma edição online, uma notícia com o título “Bancarrota: Portugal ultrapassa a Irlanda”. Nesta segunda notícia relatou que Portugal trocou de posição com a Irlanda, subindo ao 4º lugar no TOP 10 mundial dos países com maior risco de default. Esclarecia ainda que em virtude da descida do risco de default da Irlanda - que já se vinha a observar desde segunda-feira, Portugal acabou por ultrapassar este país, cuja probabilidade de incumprimento se situa, agora, em 39,71%, tendo descido para a 5ª posição naquele TOP 10. Ficámos ainda a saber Portugal liderou hoje os países com maior subida diária deste risco.

Estamos pois numa daquelas voltas lançadas das provas de meio fundo e começo a sentir-me como nas madrugadas em claro para ver o Carlos Lopes ganhar e o Fernando Mamede desistir. Os Gregos devem começar a ficar preocupados porque o Engenheiro já disse que não é homem de desistir. Parece que desta o pódio não nos escape. Infelizmente!

Thursday, March 24, 2011

O heroico Major Fangueira Fagundes (com todolos os seus anexos)


Não me parece que algum alcoolizado major tenha tomada uma qualquer câmara municipal deste país à beira mar plantado, mas as semelhanças da realidade nacional cada vez são maiores com a ficção imaginada pelo Luís Novais no seu último livro.

Sobre o livro, o Professor Aguiar e Silva apresenta-o assim: “O novo romance de Luís Novais, O heróico major Fangueira Fagundes (com todolos seus anexos), é uma alegoria e uma sátira impiedosa sobre diversos sectores da sociedade e da política portuguesas contemporâneas. O «pequeno mundo» representado no romance é a imagem convulsiva e clownesca de um país sem vergonha e afundado num lodaçal cívico. O cómico e o burlesco das personagens e das situações ressumam amargor e indignação ética, suscitando no leitor ora o riso irreprimível, ora a reflexão angustiada. Luís Novais é um «cronista» que maneja habilmente uma técnica narrativa complexa e que utiliza com domínio soberbo uma escrita de incomum riqueza estilística, desde o nível lexical até ao plano metafórico.”


Sinopse do Livro:
Uma madrugada do ano de dois mil e tal. Um país imaginário chamado Ocidental Praia. Um alcoolizado major que reúne os soldados na parada e decide ocupar os paços do município. Na manhã seguinte, como se comportarão os personagens deste livro? O director do boletim municipal, o bibliotecário e o professor. A recém-licenciada que vende tostas num quiosque e o especulador imobiliário. E o homem que se crê o Super Homem? E o empresário prestes a perder tudo? A operária e o imigrante africano. O presidente do município, o primeiro-ministro e a prostituta. O imperador, o banqueiro e o administrador bancário de terceira linha… Trabalhando com mestria uma multiplicidade de personagens, Luís Novais faz-nos com humor o retrato dum país espartilhado e a viver em equilíbrios precários… até que, vindo do nada, esse obscuro e ingénuo major se revela um detonador.

Tuesday, March 22, 2011

Um dia em Fafião

foto dos participantes

No Sábado participei numa actividade comunitária organizada pela Vezeira, uma associação que em Fafião procura preservar, valorizar e promover o património e as tradições comunitárias. Totalmente integrada no PNPG, Fafião é uma aldeia do Concelho de Montalegre, pertencente à freguesia de Cabril, na Fronteira entre o Minho e Trás-os-Montes e, como todas as suas vizinhas, nos últimos tempos perdeu imensa população.  Uma fatalidade que esta associação, de certa forma associada ao baldio, procura contrariar através da valorização das suas tradições e actividades tradicionais. Um dia vem passado na companhia de gente muito interessante e que espero reencontrar mais vezes.

Thursday, March 17, 2011

Lapela (Cabril) e O Foral de D. Dinis - por João Soares Tavares

Para os que se interessam pela história dos locais uma crónica que recebi e que pode ser consultada aqui

A investigação histórica é um trabalho apaixonante, embora moroso e paciente. Um trabalho solitário, mas, no final, sentimos qualquer coisa de bom que reconforta e perdura.

Frequentemente, o investigador tem um procedimento semelhante ao de um detective que procura descobrir a origem de um crime juntando as diferentes peças. Momento frustrante acontece quando descobre a pista certa, mas não encontra a última peça do puzle.

Quando há uns anos atrás vasculhei por tudo o que era arquivo, biblioteca ou museu, na peugada de um documento informativo sobre a origem de Lapela, uma aldeia encaixada entre montes graníticos a olhar para a Serra do Gerês, pertencente à freguesia de Cabril do concelho de Montalegre, os resultados não foram animadores. Povoação antiga era por certo. Mas… qual seria o ano da fundação?

Foi um tempo em que procurava descobrir a terra natal de João Rodrigues Cabrilho, o descobridor da Costa da Califórnia, cujo nascimento os documentos apontavam para cerca de 1500. A tradição oral estava enraizada em Lapela. Portanto, era fundamental saber se no limiar do século XVI essa aldeia já existia.

Quanto à sede da freguesia – Cabril – não foi muito difícil descobrir alguns dados importantes. O “Inventário das Igrejas, Comendas e Mosteiros dos reinos de Portugal e Algarves”, realizado nos anos de 1320 e 1321, menciona a paróquia da Igreja de S. Lourenço de Cabril. Lapela não tendo igreja estava ausente. Somente no recenseamento ordenado por D. João III, o “Numeramento Geral de 1527-30”, Lapela aparece mencionada. Foi este o documento mais antigo que descobri referindo aquela povoação.

A tradição oral da naturalidade de Cabrilho em Lapela era um dado que já vinha de longe, mas, para a História vale o que vale. O recenseamento de 1530 confirmava Lapela ter vida nessa data. Havia, portanto, uma diferença de cerca de 30 anos entre o referido documento e a data do nascimento do navegador barrosão. Os mais exigentes poderiam questionar-me: sem um documento histórico como poderia garantir a localidade de Lapela cerca de 1500, isto é, pelo ano do nascimento de Cabrilho? Não podia. Havia indícios. Mas… faltava a última peça do puzle.

Felizmente, descobri depois um documento do século XVI: “Méritos y servicios de Juan Rodriguez Cabrillo”, Achivo General del Gobierno de Guatemala, Anales de la Sociedad de Geografia e Historia, que relaciona o navegador barrosão com Lapela. (1)

“Quem procura sempre alcança”, poderia ser o título desta crónica. Recentemente, quando pesquisava um assunto histórico sobre o reinado de D. Dinis em documentos do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, tive uma enorme surpresa ao encontrar na documentação pertencente à Chancelaria de D. Dinis, referência a um foral concedido por esse monarca a Lapela. Inicialmente pensei numa outra povoação com o mesmo topónimo. Mas não é. Trata-se de Lapela no termo de Barroso. O foral foi outorgado por D. Dinis em 13 de Dezembro de 1327 (Era de César), que corresponde ao ano de 1289 da Era Cristã. (2) (Está datado de 3 de Janeiro do mesmo ano, o foral concedido por D. Dinis a Montalegre.)

Um caso surpreendente porque segundo o documento foreiro, não é um contrato de aforamento individual, mas uma carta de foro outorgada por D. Dinis aos povoadores de Lapela.

São estes os encantos da pesquisa histórica. De vez em quando o investigador é presenteado com uma pérola que o reconforta e o estimula a continuar.

Este foral de Lapela tem um enorme interesse, porque Cabril, paróquia e sede da freguesia, não possui foral de D. Dinis, nem de qualquer outro rei. Das 15 povoações (Segundo as Memórias Paroquiais tinha 16 lugares em 1758) que completam a freguesia de Cabril apenas Lapela teve esse privilégio.

Eram já conhecidos outros forais e cartas de povoamento outorga dos reis D. Sancho I, D. Afonso III, D. Dinis e D. Manuel I, a povoações da Terra de Barroso. Todavia, este foral de Lapela é uma revelação, um testemunho da visão do rei “Lavrador”. Quem imaginaria Lapela, um recôndito lugar em finais do século XIII, localizado nas bandas da Serra do Gerês, despertasse o interesse de D. Dinis para aí fundar uma Póvoa?

A explicação encontra-se, segundo parece, na própria Chancelaria Dionisina. Em 3 de Junho de 1289, chegou ao conhecimento de D. Dinis, estarem os nobres de Barroso a fazer contratos de distribuição de terrenos do património real, com prejuízos para a Coroa. D. Diniz mandou revogar esses contratos resultantes de uma usurpação fraudulenta e retomou a posse das terras por estarem “mal paradas”. (3) O foral de Lapela e outros outorgados pelo monarca na Terra de Barroso após 3 de Junho de 1289, (notar que o foral de Lapela data de 13 de Dezembro de 1289) provavelmente são consequência das fraudes praticadas pelos poderosos senhores de Barroso. D. Dinis marcava assim o território impondo o seu senhorio e, simultaneamente, promovia o povoamento em zonas inóspitas onde se ia demarcando a fronteira beneficiando a defesa e o aumento das rendas reais. À semelhança de outros reis, D. Dinis aliciava os povoadores isentando-os do serviço militar, porque estando em zona de fronteira competia-lhes defender a região.

O povoamento de Lapela (e de outras localidades de Barroso) foi lento por diferentes motivos. A localização da aldeia de acesso difícil é factor a ter em conta. (Nos anos setenta e oitenta do século passado ainda conheci e percorri algumas vezes o precário caminho florestal – em abono da verdade de uma magnífica beleza envolvente – que ligava Lapela a Montalegre. Imagine-se como seriam os acessos à povoação alguns séculos antes.) Além do isolamento, as epidemias verificadas até finais do século XV, nomeadamente a Peste Negra de 1348, originando a diminuição da população por morte ou por abandono da terra, também não serão alheias. Depois, no século XVI, finais do século XIX e, no século XX, surgiu outra “epidemia”. Esta não matava, mas provocou resultados semelhantes. Foi a emigração. Contudo, Lapela tem motivos justificados para se orgulhar do seu passado histórico.

Em 28 de Abril de 1385 com confirmação em 20 de Agosto do mesmo ano, Lapela integrada na Terra de Barroso foi doada por D. João I a D. Nuno Álvares Pereira. Em 1401, o mesmo território fez parte do dote de casamento de Dona Beatriz Pereira, filha de D. Nuno Álvares Pereira com D. Afonso conde de Barcelos, filho bastardo de D. João I. Portanto, Lapela entrou naquele dote. Passou a pertencer à poderosa Casa de Bragança, embora o título de Conde de Bragança fosse concedido a D. Afonso apenas em 1442. Devo ressalvar que em 1483, devido a uma eventual traição do Duque de Bragança a D. João II, este rei mandou confiscar todos os bens da Casa de Bragança, Lapela, obviamente incluída. Foi uma mudança temporária porque D. Manuel I em 1496 reabilitou a Casa de Bragança restituindo-lhe os bens que lhe foram anteriormente confiscados.

Cerca de 1500, nascia em Lapela João Rodrigues Cabrilho o descobridor da Costa da Califórnia quatro décadas depois.

O foral de Lapela outorgado por D. Dinis vai certamente surpreender os barrosões interessados pela História da sua terra, e encher a alma dos habitantes de Lapela que já tinham forte motivo de regozijo: serem conterrâneos de João Rodrigues Cabrilho. Poderão também afirmar com justificada razão: Lapela foi fundada em 13 de Dezembro de 1289 por D. Dinis. Portanto, já existia dois séculos antes do nascimento de Cabrilho.

Romanceando agora dentro de um raciocínio lógico, se D. Dinis não concedesse foral a Lapela, permitindo o povoamento daquela região montanhosa erma ou quase erma em finais do século XIII, o descobridor da Costa da Califórnia seria outro e, provavelmente, Lapela nem existiria no século XVI.

Lapela homenageou João Rodrigues Cabrilho baptizando uma rua da localidade com o seu nome. Um acto que dignifica os seus habitantes. Falta agora honrar D. Dinis, o rei fundador da povoação.

Compete às Entidades representativas do concelho preservar a História desta terra, porque daqui a quinze dias sairá o número seguinte do jornal com temas novos que, obviamente, farão esquecer o assunto que hoje me trouxe aqui. Um Povo sem memória é um Povo sem alma…

NOTAS:
(1) “João Rodrigues Cabrilho um Homem do Barroso?”, de João Soares Tavares, Edição da Câmara Municipal de Montalegre, 1998, págs. 43,44 e 45.
(2) Chancelaria de D. Dinis, Livro I, fl. 267, Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
(3) Chancelaria de D. Dinis, Livro I, fl. 258, Arquivo Nacional da Torre do Tombo.