Abrigados junto a um penedo na vertente norte, escutámos o Manuel António a ler alguma informação retirada do blogue Garcias – Montanhas de Portugal sobre a Penameda (ver aqui) de onde tínhamos acabado de descer. O dia não fora particularmente feliz para desde o “cume [...] admirar um fantástico panorama que estende para todas as direcções”. O nevoeiro tinha coberto a montanha e apenas a espaços permitiu alargar as vistas e vislumbrar os horizontes.
A leitura foi enunciando os topónimos dos locais que em dia aberto se avistam:
«A oeste e sudoeste é visível a Serra do Soajo culminando nos seus dois pontos mais altos, a Pedrada e a Peneda. A noroeste vemos o Fojo com o seu cume relativamente planáltico com as suas torres eólicas e mais abaixo a aldeia de Bouça dos Homens. Mais ao longe, surgindo no nosso campo de visão entre a montanha do Fojo e a do Outeiro Alvo podemos ver o Cabeço do Pico.O cume rochoso do Outeiro Alvo surge muito perto de nós (fica situado no mesmo maciço que Penameda) encimado por uma torre de pedra.A nordeste podemos observar ao longe na serra da Peneda o Vido e mais a sul no mesmo maciço a Aguieira/ Chã da Matança e o Couto do Osso.Por detrás deste maciço vemos a imensidão do Planalto de Castro Laboreiro culminando no cabeço do Giestoso. Em direção a sudeste podemos notar o vale do rio Lima e do outro lado deste ao longe o Larouco e alguns dos picos principais do Gerês como, de leste para oeste, o Alto de Candal, a Fonte Fria, a Nevosa, o Pico do Sobreiro, Alto da Amoreira/ Laje do Sino, Coções do Concelinho, Alto das Albas, Borrageiro e até o topo do Pé de Cabril. Finalmente a sul podemos visualizar a Cruz do Touro e a Louriça na serra Amarela.»
A pausa era para retemperar as forças e, enquanto comia o que retirava da mochila e o que os meus companheiros de caminhada comigo compartiam, a conversa foi fluindo. Sobre a leitura partilhei com os meus companheiros de caminhada que achava curioso o topónimo ”matança” pois já o conhecia em outros locais e atendendo à sua repetição deveria ter outra origem das explicações algo fantasiosas normalmente associadas a episódios guerreiros (ver sobre Matança aqui, aqui e aqui).
Alguns dias mais tarde recebi do Manuel Moutinho (Calcorreando) um link para o blogue “Um blog sobre Algodres” que abordava à explicação do topónimo da freguesia de Matança, concelho de Fornos de Algordes (ver aqui).
Mais uma vez, uma das hipóteses repetia a explicação fantasiosa e guerreira. Só que outra, mais consentânea com a frequência do topónimo apontava para uma outra origem.
«Porém, um insígne estudioso da toponímia portuguesa, o saudoso A. de Almeida Fernandes, propõe uma explicação diferente, menos ligada ao sentido imediato – quase “falante” – do termo Matança: “(...) Creio que se trata de derivado de “matto”, como Matados, Matela, Matinho, Matagosa, Matosa, etc., com seus derivados e flexões.“»
O “Um blog sobre Algordes” concluía: “As terras da Matança terão sido assim, provavelmente, densos matagais que foram arroteados e povoados na época em que se fixou este topónimo, que não terá a ver com qualquer mortandade ali ocorrida.”
Seguindo esta hipótese, verifiquei a frequência do topónimo no “Reportório toponímico de Portugal – Continente (carta 1/25.000)”, uma publicação dos Serviço Cartográfico do Exército – Ministério do Exército (Fev – 1967) que comprei num alfarrabista e que em 3 volumes compila os 165.710 topónimos das cartas militares da escala 1/25.000 de Portugal continental publicadas até 1965.
Para Matança encontrei 7 referências e uma para Mantancinha. As de Matança correspondem a: casas (1), povoação não importante (1) região (2) sede de freguesia (1) vértices de outras ordens ou auxiliares (2). A de Mantancinha corresponde a uma povoação não importante.
Encontrei ainda outros topónimos muitos semelhantes como: Matadosa; Mataduços; Matagal; Matagosas; Matagosinha; Matagueira; Matama; Matanga; Matao; Matareu; Matarães e muitas referências para Mata(s). Há ainda uma curiosidade de na carta 330 haver um Matadouro que corresponde a um vértices de outras ordens ou auxiliares.
Quanto à dispersão geográfica do topónimo Matança, ela abrange as cartas militares: 384;137; 2; 340; 180; 9 e 31. Sendo que na carta 31, para além do vértice Matança (ver aqui) existe ainda a Ponte da Matança.
Numa primeira conclusão, a frequência do topónimo parece confirmar a hipótese de uma origem diferente da fantasiosa referência a uma mortandade.
Continuando as pesquisas sobre o topónimo, no blogue “toponímia galego-portuguesa e brasileira” (ver aqui) comprovo que: “alguns topónimos referem-se às características bravias da vegetação. são ou foram, em geral, matas ou matagais de onde o ser humano se afastava. aí só cresce ou crescia vegetação silvestre, mais ou menos densa, mais ou menos emaranhada. estes topónimos e seus derivados são muito frequentes em toda a Península, embora mais no norte, e, por isso, também em Portugal e na Galiza”
Sobre o topónimo, este último blogue considera que «Matança (Pt.)/”Matanza" (Gz.); e Matancinha - diminut. de "Matança" derivam de "Mata" e não de "matar.»
Assim, sem excluir que alguns dos topónimos possam assinalar alguma mortandade ocorrida, parece-me que na maioria dos casos, senão em todos, na origem estará a características da cobertura vegetal.
Ainda sobre Mantança/Matanza, a casa onde a poetisa Galega Rosalia de Castro viveu os últimos anos da sua vida, e hoje a sua Casa-Museu, designa-se "Casa da Matanza".
sobre a Penemeda:
sobre o topónimo Matança (Forno de Algordes)
sobre o topónimo Matança
sobre a caminhada com os Calcorreando
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