Thursday, December 18, 2014

Ainda sobre o topónimo Matança

 

Abrigados junto a um penedo na vertente norte, escutámos o Manuel António a ler alguma informação retirada do blogue Garcias – Montanhas de Portugal sobre a Penameda (ver aqui) de onde tínhamos acabado de descer. O dia não fora particularmente feliz para desde o “cume [...] admirar um fantástico panorama que estende para todas as direcções”. O nevoeiro tinha coberto a montanha e apenas a espaços permitiu alargar as vistas e vislumbrar os horizontes.

A leitura foi enunciando os topónimos dos locais que em dia aberto se avistam:
«A oeste e sudoeste é visível a Serra do Soajo culminando nos seus dois pontos mais altos, a Pedrada e a Peneda. A noroeste vemos o Fojo com o seu cume relativamente planáltico com as suas torres eólicas e mais abaixo a aldeia de Bouça dos Homens. Mais ao longe, surgindo no nosso campo de visão entre a montanha do Fojo e a do Outeiro Alvo podemos ver o Cabeço do Pico.
O cume rochoso do Outeiro Alvo surge muito perto de nós (fica situado no mesmo maciço que Penameda) encimado por uma torre de pedra.
A nordeste podemos observar ao longe na serra da Peneda o Vido e mais a sul no mesmo maciço a Aguieira/ Chã da Matança e o Couto do Osso.
Por detrás deste maciço vemos a imensidão do Planalto de Castro Laboreiro culminando no cabeço do Giestoso. Em direção a sudeste podemos notar o vale do rio Lima e do outro lado deste ao longe o Larouco e alguns dos picos principais do Gerês como, de leste para oeste, o Alto de Candal, a Fonte Fria, a Nevosa, o Pico do Sobreiro, Alto da Amoreira/ Laje do Sino, Coções do Concelinho, Alto das Albas, Borrageiro e até o topo do Pé de Cabril. Finalmente a sul podemos visualizar a Cruz do Touro e a Louriça na serra Amarela.»
A pausa era para retemperar as forças e, enquanto comia o que retirava da mochila e o que os meus companheiros de caminhada comigo compartiam, a conversa foi fluindo. Sobre a leitura partilhei com os meus companheiros de caminhada que achava curioso o topónimo ”matança” pois já o conhecia em outros locais e atendendo à sua repetição deveria ter outra origem das explicações algo fantasiosas normalmente associadas a episódios guerreiros (ver sobre Matança aqui, aqui e aqui).

Alguns dias mais tarde recebi do Manuel Moutinho (Calcorreando) um link para o blogue “Um blog sobre Algodres” que abordava à explicação do topónimo da freguesia de Matança, concelho de Fornos de Algordes (ver aqui).

Mais uma vez, uma das hipóteses repetia a explicação fantasiosa e guerreira. Só que outra, mais consentânea com a frequência do topónimo apontava para uma outra origem.

«Porém, um insígne estudioso da toponímia portuguesa, o saudoso A. de Almeida Fernandes, propõe uma explicação diferente, menos ligada ao sentido imediato – quase “falante” – do termo Matança: “(...) Creio que se trata de derivado de “matto”, como Matados, Matela, Matinho, Matagosa, Matosa, etc., com seus derivados e flexões.“»
O “Um blog sobre Algordes” concluía: “As terras da Matança terão sido assim, provavelmente, densos matagais que foram arroteados e povoados na época em que se fixou este topónimo, que não terá a ver com qualquer mortandade ali ocorrida.”

Seguindo esta hipótese, verifiquei a frequência do topónimo no “Reportório toponímico de Portugal – Continente (carta 1/25.000)”, uma publicação dos Serviço Cartográfico do Exército – Ministério do Exército (Fev – 1967) que comprei num alfarrabista e que em 3 volumes compila os 165.710 topónimos das cartas militares da escala 1/25.000 de Portugal continental publicadas até 1965.

Para Matança encontrei 7 referências e uma para Mantancinha. As de Matança correspondem a: casas (1), povoação não importante (1) região (2) sede de freguesia (1) vértices de outras ordens ou auxiliares (2). A de Mantancinha corresponde a uma povoação não importante.

Encontrei ainda outros topónimos muitos semelhantes como: Matadosa; Mataduços; Matagal; Matagosas; Matagosinha; Matagueira; Matama; Matanga; Matao; Matareu; Matarães e muitas referências para Mata(s). Há ainda uma curiosidade de na carta 330 haver um Matadouro que corresponde a um vértices de outras ordens ou auxiliares.

Quanto à dispersão geográfica do topónimo Matança, ela abrange as cartas militares: 384;137; 2; 340; 180; 9 e 31. Sendo que na carta 31, para além do vértice Matança (ver aqui) existe ainda a Ponte da Matança.

Numa primeira conclusão, a frequência do topónimo parece confirmar a hipótese de uma origem diferente da fantasiosa referência a uma mortandade.

Continuando as pesquisas sobre o topónimo, no blogue “toponímia galego-portuguesa e brasileira” (ver aqui) comprovo que: “alguns topónimos referem-se às características bravias da vegetação. são ou foram, em geral, matas ou matagais de onde o ser humano se afastava. aí só cresce ou crescia vegetação silvestre, mais ou menos densa, mais ou menos emaranhada. estes topónimos e seus derivados são muito frequentes em toda a Península, embora mais no norte, e, por isso, também em Portugal e na Galiza

Sobre o topónimo, este último blogue considera que «Matança (Pt.)/”Matanza" (Gz.); e Matancinha - diminut. de "Matança" derivam de "Mata" e não de "matar.»

Assim, sem excluir que alguns dos topónimos possam assinalar alguma mortandade ocorrida, parece-me que na maioria dos casos, senão em todos, na origem estará a características da cobertura vegetal.

Ainda sobre Mantança/Matanza, a casa onde a poetisa Galega Rosalia de Castro viveu os últimos anos da sua vida, e hoje a sua Casa-Museu, designa-se "Casa da Matanza".


sobre a Penemeda:

sobre o topónimo Matança (Forno de Algordes)


sobre o topónimo Matança


sobre a caminhada com os Calcorreando

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